terça-feira, 31 de janeiro de 2023

O Busão da Tropa Alfa é um estouro!



Knock it off, Hudson!

Tropa Alfa por John Byrne era uma obrigação moral. Forjadas no fogo da má vontade de seu próprio criador, as histórias da superequipe canadense eram curtidas num foda-se narrativo tão descarado que acabaram rendendo alguns dos momentos mais bizarros, violentos e divertidos da Marvel.

Então, como um dos pretensos pais adotivos desse filhote renegado, comemorei o aniversário de 14 anos do volume 2 da descontinuada Os Maiores Clássicos da Tropa Alfa — com capa cartão e o sumido-mas-jamais-esquecido papel LWC — catando logo o Omnibus numa combinação marota somando 40% de desconto (progressivo + cupom do HQ Barata). Mesmo assim saiu caro.

Mas como precificar o Víndix/Guardião James MacDonald Hudson explodindo na frente da Heather? Impossível.

E aquilo era só a ponta do iceberg.


Está lá todo o run do Byrne, do Alpha Flight #1 (maio/1983) ao #28 (julho/1985), o #29 com Mike Mignola nos desenhos e Bill Mantlo amarrando as pontas soltas da saideira, mais o tie-in correspondente de Secret Wars II #4 (julho/1985). Foi uma longa espera.

Até então, a Panini havia editado pouco menos da metade da fase. Só tínhamos as loucas edições da Abril, onde nem o Beyonder conseguia se salvar.

Agora só me resta o Bu$ão do Namor para fechar todo o Byrne que vale.


Cena pós-créditos:


Já elaborei sobre isso antes. Mas ô custo-benefício dos infernos.

sábado, 28 de janeiro de 2023

The Television will not be televised


Thomas “Tom Verlaine” Miller
(1949 - 2023)

Que tristeza saber da passagem de Tom Verlaine, frontman do grande Television. Tanto o Marquee Moon (1977) quanto o Adventure (1978) estão entre os discos que mais ouvi nesta vida. Clássicos indiscutíveis. Tão básicos e seminais para o rock quanto uma guitarra poderia ser.

Aliás, adoro o apelido que o NYT deu para o Verlaine: o "deus relutante da guitarra." Com justa razão.

Verlaine era um completo alienígena para os tempos atuais, um forasteiro deslocado no tempo. Holofotes nunca foram a sua praia. Música sempre foi a única prioridade.


E o fim de uma era segue a passos largos...

quinta-feira, 26 de janeiro de 2023

¿Donde Esta Oesterheld?

Héctor Germán Oesterheld era um contador de histórias prolífico. O jornalista, romancista e quadrinista argentino construiu uma bibliografia extensa, que inclui obras atemporais e aclamadas no mundo inteiro, como Mort Cinder, Sherlock Time, Ernie Pike, além, é claro, de O Eternauta. Ao mesmo tempo, no vasto universo de autores de livros, quadrinhos e da cultura em geral, poucos tiveram uma história tão triste quanto a dele.

Como é bem conhecido (mas essencial relembrar), Oesterheld viveu seus últimos anos de profissão na clandestinidade. Em algum ponto do ano de 1977, foi sequestrado, torturado e "desaparecido" pela ditadura militar argentina. Tinha de 58 para 59 anos, ninguém sabe ao certo. O mesmo destino coube às suas quatro filhas: Estela Inés, Beatriz Marta (a única cujo corpo foi recuperado), Marina e Diana Irene — as duas últimas, grávidas na época das prisões.

O relato a seguir é do psicólogo Eduardo Arias, detido com Oesterheld na mesma prisão clandestina e uma das últimas pessoas a vê-lo. O depoimento foi publicado originalmente na revista Feriado Nacional em outubro de 1983 e reproduzido na íntegra no excelente livro Bienvenido - Um Passeio pelos Quadrinhos Argentinos (Zarabatana, 2010), do jornalista e professor Paulo Ramos.


Uma porrada.

"Onde está Oesterheld?" há muito deixou de ser uma pergunta. É, entre muitas outras coisas, um lembrete.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

Era uma Vez no Noroeste


Publicada em Tex Platinum #4 (outubro/2016), a história "Em Território Selvagem" já é uma velha conhecida dos brasileiros. Saiu lá fora originalmente em Maxi Tex #5 (outubro/2001), foi editada pela Mythos em Tex Anual #4 (dezembro/2002), depois na Platinum e ainda pela Salvat, no volume 45 da coleção Tex Gold (março/2020). Nada mal. E merecido. Em pouco mais de 300 páginas, o roteiro de Mauro Boselli decupa a bem sucedida fórmula do ranger da Bonelli e experimenta perspectivas fora de seu contexto habitual.

Tudo começa com a descoberta de um cadáver portando uma enigmática mensagem para o Coronel Jim Brandon, da Polícia Montada Canadense. Para investigar o caso, o jaqueta vermelha vai até o extremo noroeste selvagem, onde desaparece sem deixar vestígios. Logicamente, seus velhos camaradas Tex Willer e Kit Carson partem em seu encalço numa jornada até os distantes territórios gelados, com ajuda do boa-praça Gros-Jean e da guia indígena Kathy Dawn.

Com essa premissa básica à Josey Wales, Boselli agrega vários elementos clássicos dos Texones a algumas inovações muito bem-vindas. Uma delas é a própria Dawn.


Damn, Dawn...

Devo admitir que a personagem balançou alguns sinos da minha memória juvenil. Durante toda a leitura visualizei a jovem Sydney Penny no papel. Certamente pela sua presença marcante em O Cavaleiro Solitário (Pale Rider, 1985), clássico Eastwoodiano da Sessão das Dez, como a contestadora guria Megan Wheele — por sinal, a minha 1ª "crush" de filmes (ass.: dogg, the millennial fake). Assim, a bela, carismática e invocada Dawn, envolvida em uma situação mortalmente ambígua, conquista um protagonismo poucas vezes visto em novatos(as) nos enredos dos pards.

O mesmo se aplica a Jim Brandon, cuja inspiração cinematográfica é destrinchada no ótimo prefácio de Júlio Schneider. Tipo de extra bacanudo que a Mythos sempre fez muito bem, que conste nos autos. Há sequências generosas dedicadas à odisseia solo do bravo Coronel (incluindo trips alucinógenas-Blueberryescas de dar gosto) que evidenciam todo o carinho de Boselli pelo cast de coadjuvantes. Difícil sair da leitura sem desejar um título solo do oficial canadense.

E claro que os vilões também mordem uma gorda fatia da trama. Os violentos indígenas Jericho, Ghost e Nathanael são retratados de forma rústica, mas tridimensional, enfrentando seus próprios desafios logísticos e de pessoal — como a inesperada elaboração do personagem Sombra-que-Foge, capanga nível Z que precisa se virar sozinho atrás das linhas "inimigas".

Isso também inclui o misterioso chefão Golden Eye, com um perfil Bondístico que vai além do pseudônimo. Opa, spoiler?


O genial Alfonso Font brilha nos desenhos como sempre, mas aqui, parece em estado de graça. Seus landscapes cobrindo os biomas congelados das montanhas, vales e florestas do Canadá e do Alasca são de tirar o fôlego. É a oportunidade perfeita para o espanhol voar baixo pelo chiaroscuro (repare o contraste entre as cenas noturnas e diurnas e testemunhe a explosão cerebral de Mike Mignola). Também é certeiro nas linhas duras pero flexíveis e expressivas dos personagens. Tex, em particular, está com um rosto tão sulcado e austero que parece ter saído de um épico de Sergio Leone.

Sem dúvida, artistas mais jovens, como Goran Parlov e Jacen Burrows, beberam muito nesta... Font.

(trocadilho infame na conta do efeito mescalina da arte maioral do Alfonso!)

Um aspecto sempre presente nos gibis do Tex é o dia a dia árduo e sofrido dos heróis retratado da forma mais realista e crua possível. Quanto mais difícil e extenuante, melhor e faz a expressão "o que vale é a jornada" ganhar contornos bem mais intimistas e imersivos. Aqui não é diferente — aliás, qualquer capa que tenha o Tex com neve até o joelho são um convite irresistível pra mim, pois já sei que os perrengues serão imensos e as reclamações do friento Carson maiores ainda...

Essa abordagem mais orgânica geralmente é limada dos comics de super-heróis, mas rende horrores em ambientações de época ou pós-apocalípticas. Funciona nas viagens do Conan pela Hiperbórea, funcionava nas tortuosas road trips de The Walking Dead (quem não lembra dos protagonistas matando a fome com ração canina e se apertando num trailer fedido a suor e mijo?) e funciona muito nas cavalgadas de Tex pelo Velho Oeste, onde a engenhosidade e as técnicas de sobrevivência são lei. Aqui ele chega ao despojamento de ter as roupas secando num varal enquanto faz uma pausa para lamber as feridas.

E que pausas. E que feridas.


Um equívoco comum é achar que Tex é um mocinho à moda antiga, daqueles que só atiram na arma ou no ombro dos inimigos. A fama de bom moço realmente o precede. E não descarto motivos como seu inabalável código de honra ou seu compromisso irrestrito com a lei, mas acho que a camisa amarela reluzente tem mais culpa nesse cartório. A verdade é que Tex Willer é um dos maiores carniceiros que já pisaram numa página de história em quadrinhos.

Em 1997, no livro Non Son Degno di Tex, o genovês Claudio Paglieri esmiuçou o body count do ranger, que passava da casa dos milhares. Em 2008, o autor fez uma recontagem atualizada e aterradora: até aquele momento, Willer havia levado 78 tiros (sendo 23 na cabeça!!) e despachado nada menos que 2.783 almas para o inferno.

Yippee-ki-yay, motherfucker!

Ao longo de "Em Território Selvagem", além das baixas em combate direto, o ranger manda vários evil-nativos para o além numa só tacada (ou, no caso, explosão) com uma frieza e profissionalismo de dar inveja a meninos como Frank Castle e Adrian Chase.

Será que um dia sai um "Old Man Tex", com o ranger amargando uma velhice à William Munny, de Os Imperdoáveis? Esse merecia...

TecaLibri: Non Son Degno di Tex

quinta-feira, 12 de janeiro de 2023

Uma lenda para a eternidade


Geoffrey Arnold "Jeff" Beck
(1944 - 2023)

2023 só está começando e já não é para fracos. O lendário Jeff Beck se foi no último dia 10, surpreendendo todo mundo.

Beck estava a toda, gravando, excursionando e fechando colaborações várias. Quando ouvi suas participações em duas músicas de Patient Number 9, último álbum do Ozzy, me admirei com sua disposição, técnica e musicalidade inesgotáveis.

E assim tem sido sua carreira, sem parar, desde 1962. Seja com sua antológica passagem-relâmpago pelo The Yardbirds (recomendado pelo irmão-de-armas Jimmy Page para o posto que era de Eric Clapton), com a superbanda Beck, Bogert & Appice, como The Jeff Beck Group ou na sua longeva discografia solo.

Mesmo transitando sem o menor pudor pelo blues rock, eletrônica, jazz fusion, hard rock, funk e rockabilly, Jeff Beck era uma rara unanimidade. Influenciou gerações e era admirado por todos. Inclusive pelos maiores...


E este pobre mortal não ousa comentar mais nada.

Aliás, só mais uma coisa: assim que puder, o Blow by Blow vai direto pra agulha (simbólica) no volume 11...