If you're looking for trouble... you came the right place!
Glenn Danzig é um cara que tem história pra contar. Embora seja pouco lembrado (ou conhecido) pela nova geração, o cantor influenciou muito os padrões do rock atual, inclusive aquele tipo que perambula incansavelmente pelo circuito pop. Ele criou o link definitivo entre música gótica, a atmosfera lúgubre e enegrecida do Black Sabbath e uma certa mis-en-scéne de horror, decodificada diretamente das pirações teatrais do Alice Cooper dos anos 70. Quem leva o crédito por traduzir essa carga gore-dark para o rock contemporâneo costumam ser grupos como Nine Inch Nails, Cradle Of Filth, Korn, White/Rob Zombie, Marilyn Manson, Dimmu Borgir, Slipknot e por aí vai, mas a coisa começou bem antes.
Egresso do grupo punk seminal Misfits e do cultuado Samhain, Danzig inaugurou a carreira de sua banda homônima em 1988 com um álbum supreendente. Limou todo o background psychobilly em favor de um crossover demoníaco envolvendo blues rock de bar vagabundo, o messianismo apocalíptico de Johnny Cash, doom metal, Black Sabbath e AC/DC, com vocais pendendo entre a introspecção rebelde de Elvis Presley e a ironia curtida à whisky de Jim Morrison. Adicione aí uma certa aura maldita e letras estilo filme B de terror, discorrendo sobre ocultismo, desordem, anarquia, orgias profanas, bruxaria, demonismo, súcubos e voilá... é uma festa no inferno ouvindo os discos do Danzig com o volume lá no céu (perdoai o trocadilho!).
Entre um petardo e outro, Glenn ainda lançou um álbum solo, Black Aria, de 1992, composto basicamente de... árias. Esse disco merece um destrinchamento todo especial, em uma outra hora.
A lista de fãs e eventuais "influenciados" inclui vários medalhões do som pesado, como Tony Iommi, o pessoal do Slayer, Pantera e, principalmente, James Hetfield e Lars Ulrich, do Metallica.
Apesar dessa química das profundezas ter dado muito certo nos 4 primeiros discos, um erro fudido de direcionamento balançou a carreira do Evil Elvis. Nos álbuns seguintes, o Danzig passou a ser uma banda bem meia-boca, com bons momentos dividindo espaço com inovações pra lá de equivocadas.
Então é isso aí. Na faixa, um resumão disco-a-disco...
(1988)
O primeirão do Danzig já vinha com uma capa bem "discreta" e com uma sonzeira blues rock digna daquele bar infernal do filme Um Drink no Inferno. Aqui, Danzig nos revela que é o próprio capeta (I Am Demon), fala de conflitos espirituais (Possession), mulheres demoníacas (She Rides), condenações (Soul In Fire, End Of Time) e tudo aquilo que Lúcifer costuma arquitetar em seu dia-a-dia. As faixas Mother e Twist Of Cain (com seu riff inesquecível) foram os maiores hit singles desse disco.
Talvez por ser justamente o debut, a execução é mais básica, fazendo o vocalista se destacar sobremaneira. Danzig evoluiu muito tecnicamente desde seu tempo liderando o Misfits. A formação era a clássica trinca dos primórdios da banda: Eerie Von no baixo, o ótimo John Christ na guitarra e o folclórico Chuck Biscuits na batera (ele é o fã número zero do Zé do Caixão!).
Um puta disco de rock'n'roll. Diria até que é um semi-clássico trilhando os mesmos caminhos mal-assombrados de Back In Black, Paranoid e The Number Of The Beast.
(1990)
E o enxofre-rock continua firme e forte! Mesmo carregando na pegada metálica, Danzig comete um discaço e, ao mesmo tempo, mergulha de cabeça no Delta do Mississipi. Aqui, o cara inicia o satanismo de histórias em quadrinhos que viria a ser sua marca 666 registrada. A produção está bem mais clara e o som está melhor trabalhado, com uns backing vocals até acima da média, naquele estilo chamado-e-resposta. Os refrões estão muito mais grudentos, vide Girl, Long Way Back From Hell, Her Black Wings, a maneiraça Devil's Plaything e Snakes Of Christ - que, além de ser ótima pra profanar a religião a plenos pulmões debaixo do chuveiro, também tem um riff totalmente assassino!
Já o blues comparece na ótima Killer-Wolf, e nas semi-acústicas I'm The One e na ótima 777, uma viagem movida a slide-guitar. Destaque também para a baladona presleyana Blood and Tears, linda, linda. The devil loves too!
O disco termina bem dark, com a soturna Pain In The World. O andamento lembra muito o clássico Dazed And Confused, do Led Zeppelin, o que é obviamente uma ótima referência.
Uma curiosidade... a capa alternativa de Lucifuge, com a foto de cada um da banda, é praticamente uma reedição da capa do clássico disco de estréia dos Doors. Dá uma conferida:
...qualquer semelhança é mera influência. E não é interessante ver que o Doors influenciou artistas tão díspares quanto Danzig e... sei lá, Echo & The Bunnymen?
(1992)
Dizem que esse é o melhor do Danzig. Só não digo que é, pois essa primeira fase é realmente toda memorável. Em execução e produção está um passo à frente do disco anterior. É uma evolução natural, que no caso do Danzig resultou em uma pérola irretocável. Ao longo do álbum vão aparecendo algumas inovações, como barulhos e ruídos estranhos acompanhando as músicas, como se fosse o som de espíritos enfurecidos. Ecos distorcidos vindos de algum nicho infernal. Mas antes que eu comece a viajar demais, os tais sonzinhos foram feitos através de instrumentos convencionais, como breves estaladas no piano, cordas e o próprio aro da caixa da bateria.
Danzig começa a exercitar aqui o seu bom gosto artístico na arte gráfica dos discos. Ninguém menos que H.R. Giger assina a ilustração da capa. Ele já fez uma capa para os dinossauros do Emerson, Lake & Palmer, no disco Brain Salad Surgery (clique aqui para vê-la), mas dificilmente aceita trampos desse tipo. Danzig costuma dizer que ele só aceitou após ouvir uma cópia da fita master do disco. Giger ficou alucinado com o conceito do álbum. Um lance totalmente from hell...
O disco é uma coleção de "clássicos do terror", por mais cinematográfico que possa parecer. Mas é isso mesmo. Falta algum diretor esperto chamar o Danzig pra compor a trilha sonora de algum filme do gênero.
Godless, a faixa de abertura, começa com uma avalanche heavy e desemboca em versos praticamente declamados seguidos de uma batida lenta e carregada de suspense. Destaque para o piano mal-assombrado que persegue a quebradinha. Excelente. A música seguinte, Anything, abre bem suave, dá uma discreta inversão na melodia e tem uma leve mudança de tempo antes de cair na porrada. Awesome! Os 4 cavaleiros do Danzig fazem isso parecer fácil, mas não é não. A seguir, Bodies tem um ritmo à Booker-T (que fazia aquele tipo de blues quase-correndo) e uma guitarra de trincar os dentes. Lembra muito o The Doors nos seus momentos mais chapados e bluesy. Outros momentos arrepiantes marcam presença na grandiosa faixa-título, na largada thrasher de Left Hand Black, na introdução satan-soul em Heart Of The Devil, nas guitarradas heavy de Do You Wear The Mark e no riff tortinho de When The Dying Calls.
How The Gods Kill também traz duas das músicas mais representativas do Danzig. A bela Sistinas parece uma daquelas pop songs românticas dos anos 50, ainda mais rebuscada pelos vocais do Evil Elvis. Já a perfeita (isso aí... perfeita) Dirty Black Summer abre com um barulho de chuva, sai rasgando num riff que é maquiavélico de tão bom, e até hoje é hour-concours nos shows da banda.
(1993)
Inicialmente eram dois EPs separados. Thrall continha duas músicas inéditas, uma cover e uma versão remasterizada de Mother, e Demonsweatlive... era um ao vivo. Após um relativo sucesso no circuito metálico norte-americano, os dois passaram a integrar o mesmo pacote.
Das músicas inéditas, nota-se que a banda ainda estava no climão sombrio do álbum anterior. The Violent Fire tem aquela tradicional melodia darkótica, enquanto It's Coming Down soa mais despretensiosa, bem mais rocker. A cover citada é do clássico blueseiro Trouble - de Leiber & Stoller e imortalizado por Elvis Presley, claro. É aquele negócio... The Pelvis tirava onda de malvado e fodão já nos anos 50: "If you're looking for trouble... you came the right place... If you're looking for trouble... just look right in my face". Isso cantado pelo Danzig soa mais do que "apropriado".
Já a parte ao vivo é uma injeção de adrenalina. Com a banda em grande forma, público sold-out e Danzig cheio da moral, desfilam os clássicos (já?) Snakes Of Christ, Am I Demon, Sistinas e a emocionante Mother. Pena que são apenas essas, afinal é só um EPzinho. Com certeza, foi um showzaço.
Novamente, Danzig prova que tem bom gosto e convoca o genial Simon Bisley (Lobo, Judge Dredd, Sláine) para a fazer arte de capa. O resultado é bem ao seu estilo: selvagem, demoníaco e com aquele jeitão de barbarismo sangüinário.
Clique na imagem abaixo para ampliar a arte original:
E já que comentei do Simon Bisley, aproveito para recomendar a leitura da porradíssima insane epic tale "A Verdadeira História De Sansão e Dalila", escrita à ferro e fogo pelo Hulk. Desde o clássico Lobo Está Morto que eu não vejo tamanha perversão doentia arrombando os portões celestiais. Mas o quê o Bisley tem a ver com isso? Confesso que quando li a história, não pude deixar de imaginar uma HQ dela com o Bisley nos desenhos...
Thrall Demonsweatlive é um dos EPs mais divertidos que já ouvi (ao lado de Garage Days Revisited, do Metallica, e Broken, do Nine Inch Nails).
(1994)
Esse disco costuma ser chamado por aí de 4, mas é 4P mesmo - Four P era o nome de um antigo culto satânico (alguns dizem que ainda está na ativa). Danzig não queria apenas reciclar a mesma fórmula dos álbuns anteriores ad nauseum. Então resolveu dar a primeira guinada sonora relevante na carreira da banda. 4P tem texturas mais ásperas, distorcidas e uma estrutura musical propositalmente instável, às vezes bastante turbulento, e às vezes calmo e ambient. Há uma profusão de elementos outrora "alienígenas" no som do Danzig, como vocais distorcidos, camadas de guitarras saturadas, samples, e um piano mais freqüente e sinistro escurecendo a paisagem. O próprio timbre dos vocais se reveza em vários tons inéditos até então.
Mal comparando (bem, não tão "mal" assim), o Danzig de 4P está para o velho Danzig como o U2 de Achtung Baby esteve para o velho U2 - a reinterpretação sonora do príncipe dark foi muito similar à experimentada pelo grupo de Bono Vox naquele disco.
Mas apesar do novo approach e de algumas reestruturações sérias, as bases do velho Danzig ainda estava intacta. É só descontar o susto inicial e rever a bagunça habitual com o hard rasgadão de Brand New God e Bringer Of Death (com uns tiros de metralhadora, no maior clima de guerra), a climática Little Whip (que abre com aquelas guitarras surf music à Ventures) e a rifferama experimental de Until You Call On The Dark.
Alguns destaques saltam inevitavelmente aos ouvidos e... Cantspeak é a melhor música do Danzig que não parece com Danzig. Nem os vocais! Por muito pouco se nota que é o cara cantando. A batida hipnótica e várias camadas de guitarra em fade out remetem a música para algo próximo das primeiras fases do Gang Of Four e do Sonic Youth (!). Going Down To Die é a power ballad da vez, e a que mais lembra a fase inicial da banda. Simplesmente maravilhosa. A maravilhosa I Don't Mind The Pain e a linha soturna de Dominion são os momentos mais introspectivos do disco. Aliás, compare a melodia desta última com a de Until It Sleeps, do Metallica... coincidência? Sadistikal é o momento mais singular. Toda feita à base de samples, Danzig vocifera os versos com seu vozeirão seco sobre uma batida industrial cadenciada. Esquisita e assustadora ao mesmo tempo. Me lembrou muito o trampo paranóico de uma banda iugoslava chamada Laibach. Já Son Of The Morning Star (homenagem ao personagem da Vertigo?), é uma viagem dark old school à Planet Caravan, do Sabbath, com as guitarras levantando no refrão.
4P foi o tipo de experimentação corajosa que deu certo e que apontou novos e intrigantes caminhos para o som da banda. Único, inovador, carregado de fúria negra. Talvez boa parte disso tenha sido ao acaso... mas um feliz acaso.
Em tempo... após a última faixa existe uma daquelas famosas faixas escondidas... trata-se de umas passagens com órgão de igreja e algumas vozes ao fundo. O detalhe é que, não satisfeitos em inserí-la na faixa #66, ainda deram um jeito do display marcar exatos 66:64:41.
(1996)
A famosa "escorregada no tomate". Como diria o Mestre Yoda, perigoso é o Lado Negro do Experimentalismo... Aqui a coisa não fugiu à essa regra e resvalou todo o brilhantismo do álbum anterior para uma espécie de Lei de Murphy musical. Se você acha St. Anger, do Metallica, a maior decepção sem sentido dos últimos tempos, ouça Blackacidevil. Melhor ainda, não ouça...! Apenas confie em mim. Talvez seja o registro musical mais equivocado da História recente.
Dizem que foi uma fase cheia de problemas internos no grupo. O batera Chuck Biscuits andou chapando além da conta e tomou um pé na bunda, o que inspirou o patrão Danzig a reformular o grupo inteiro. A banda acabou entrando no estúdio com um punhado de pára-quedistas de última hora: Joey Castillo (bateria), Joe Bishara (teclados e programações... opa, programações?!) e Josh Lazey (baixo). Apesar disso, baixou um espírito one-man-band em Danzig e ele também resolveu tocar baixo, guitarra e teclados.
Danzig é um frontman. Ponto. Essa coisa de one-man-band é para artesãos como Trent Reznor (NIN), Al Jourgensen (Ministry) e Richard Patrick (Filter) - e olhe lá ainda por cima. Há sempre uma chance ínfima de uma banda se dar bem em um contexto que não lhe é natural - o que não acontece acontece aqui em nenhum momento. A impressão que dá é que o grupo se esforça ao máximo pra soar inaudível. Existem formações que conseguem dar sentido ao Caos e reunir os pedaços em quadros instigantes, como se fossem um mosaico niilista em homenagem à Destruição (como bem fazem o Atari Teenage Riot e o Cubanate), mas as batidas tecno socadas, os samples barulhentos, o feedback no talo, os guinchos electro-noisy e as guitarras e vocais hiper-ultra-distorcidos que povoam o disco inteiro acabam com qualquer linha musical compreensível/aceitável.
Trocando em miúdos, as músicas são horrorosas, mesmo para o paladar radical de um fã de Riistetyt, Rattus ou Napalm Death fase Lee Dorrian. Dificilmente um ser humano sem poderes mutantes consegue ouvir Blackacidevil até o fim, de uma tacada só. Duvido.
B lack
A ci
D evil
Com muita boa vontade dá pra encarar Sacrifice, Hand Of Doom (do Sabbath) e Ashes.
Talvez vire cult daqui há uns 25, 30 anos... da mesma forma que o doidaço Metal Machine Music, do Lou Reed.
Mas pensando bem... acho que não.
(1999)
Três anos depois e o Danzig acorda da ressaca industrial do disco anterior. O senhor das profundezas deve ter chamado a atenção do guerreiro doom, e por isso a banda voltou mais direta, enxuta e sem as tralhas high-tech de outrora. Mas ressaca é ressaca e 6:66 Satans Child, apesar de poderoso, passa longe da energia criativa da saudosa fase inicial. A sonoridade agora é bem mais minimalista, com quase nada de riffs e solos, e basicamente movida à levadas de guitarra-base e bateria. Simples assim.
Algumas bases são realmente possantes como demonstram a faixa de abertura, Five Finger Crawl, e a faixa Unspeakable. Já a ótima Cult Without A Name talvez seja a mais próxima do climão gótico das antigas. East Indian Devil (Kali's Song) trafega perigosamente pela atmosfera experimental, mas fica só na sugestão (ainda bem). Firemass também dá um susto com uma batida meio "ritmada demais", mas as guitarras bem colocadas logo modificam o contexto da música (que acabou me lembrando o Killing Joke do disco Pandemonium). A faixa-título é bem diferente e tem uma estranha quebrada de guitarra, estilo Tool. Mas o refrão cavernoso é Danzig puro.
Chega a última música, Thirteen - que já foi até regravada/imortalizada pelo venerável Johnny Cash - e temos um melancólico retorno às raízes. Nesse momento, senti que o Danzig já tinha atravessado a faixa amarela e que os bons tempos ficaram mesmo para trás. Que o digam Henry Rollins, Metallica, Living Colour e Red Hot Chili Peppers. Sinal dos tempos...
E a capa tem um jeitão de HQ não é à toa: é novamente Simon Bisley quem assina a arte. Muito bacana, por sinal.
(2001)
Os fãs do Danzig nunca tiveram muito problema com a escassez de discos ao vivo, mesmo que o único registro oficial desse tipo tenha sido o EP Demonsweatlive, de 93. Isso porque a quantidade de material pirata que circula da banda por aí é de assustar. Pra cada show deles pipocam uns quatro ou cinco CDs e DVDs ao vivo no mercado negro - alguns com uma qualidade excelente. Mas fora os parcos registros live em home-vídeos, faltava o famoso disco ao vivo do Danzig. Live On The Black Hand Side é o próprio e em dose... digo, CD duplo.
Assim como Ozzy Osbourne, Glenn Danzig é um bom escalador de instrumentistas. Seus shows sempre exibiram técnica e energia de sobra, não importando a fase em que a banda se encontrava, e isso é bem demonstrado aqui. As primeiras oito músicas do CD 1 foram extraídas da tour Halloween, de 1992 (a mesma de Demonsweatlive) e têm a mesma clássica line-up: Danzig-Christ-Von-Biscuits. As últimas 6 faixas são da tour de 4P, com Joey Castillo no lugar de Biscuits. Memorável.
Já o CD 2...
...muito mal gravado (cheio de microfonias e com várias quedas no som da guitarra), o CD 2 traz faixas mais recentes, inclusive 7th House do infame "Bad". A energia habitual e a força de composições como Her Black Wings, It's Coming Down, Do You Wear The Mark, Twist Of Cain e Mother acabam salvando o segundo disco de um belo naufrágio. Mas que eles deram um mole federal com essa produção tosca, isso deram. Já ouvi piratões muito melhores!
(2002)
Para registro: o início de 777 - I Luciferi é magistral. Unendlich é uma breve introdução com reverbers de guitarra fazendo um dueto com uma espécie de canto gregoriano fantasmagórico. Na seqüência, a pesadona Black Mass dá a tônica do que vem a seguir. Em um contexto geral, I Luciferi retoma a linha de Satans Child, mas de forma mais básica e rocker. Algumas passagens new metal se fazem presentes aqui e ali (como os "apitos" de guitarra), mas não sei ao certo quem é o ovo e que é a galinha nessa história. De qualquer modo, não é algo que chega a desvirtuar o que se espera do Danzig - o problema é que, após essa seqüência de altos e baixos, o quê exatamente se espera do Danzig...?
Como você já deve ter percebido, comentar sobre os discos do Danzig é quase como escrever um tratado metafísico pra mim. Não consigo simplesmente classificá-los com um 'bom' ou um 'ruim', mesmo no caso do "Bad". É foda. Na próxima vez vou escrever sobre o Ramones... dá menos trabalho e os meus neurônios não precisam ser obrigados a trabalhar sob efeito maciço de cafeína. :)
Mas voltando à lida...
Após o início demolidor, o disco segue com a ritmada Wicked Pussycat. A levada é largadona e a letra é meio s&m. God Of Light (que não é uma homenagem ao pessoal de Furnas...) tem aqueles irritantes apitos de guitarra que eu mencionei. Desde que o Machine Head começou com essa praga, há alguns anos atrás, passei a viver num mundo pior. Na seqüência, Liberskull chega rasgando com uma slide guitar canibal e um ritmo cadenciado. Sonzeira. A gótica Dead Inside é um daqueles momentos mais ternos e viajantes. Pena que o refrão fica bem aquém do climão escuro do início. Aí chega Kiss The Skull... essa guitarra foi sampleada de Beautiful People, do Marilyn Manson, ou estou ouvindo coisas?! Na boa Danzig... tu roubou legal. Mas a música é ótima. Parece o hino marcial do 66º destacamento de infantaria do exército do inferno.
Na seqüência final, a faixa-título cria uma atmosfera bem tétrica. Já Naked Witch (adorei esse título) quase nos remete ao blues rock do início. Se não fosse a mixagem abafada dos vocais... tsc! Na música The Coldest Sun... mais uma pós-pré-referência. Explico... o andamento slow heavy com o gancho poderoso de guitarra e a vocalização estrondosamente grave é Type-O Negative puro. Tirando o refrão, a voz de Danzig está idêntica à do vampiro Peter Steele, do Type-O.
Considerações finais... 777 - I Luciferi é sim um bom álbum, e muito funcional no que propõe, mas tem uma particularidade que costuma irritar muitos: é exageradamente referencial. Tanto é que citei aqui, de relance, umas três ou quatro bandas que lembrei enquanto o disco rolava. O detalhe é que todas essas bandas, sem exceção, foram largamente influenciadas pelo Danzig. Então, o que Danzig faz aqui é quase uma autofagia por tabela. Em I Luciferi ele imita aqueles que passaram a vida toda o imitando. Estranho ciclo, não?
(2004)
Como o Danzig já vinha com um direcionamento new metal, nada mais natural que Tommy Victor assumisse a guitarra. Victor é o líder do Prong, e foi um dos caras que mais influenciaram o tão discutido "novo metal". Mas calma lá... o Prong é uma grande banda (apesar de há tempos não produzir nada do calibre de Beg To Differ, Prove Your Wrong e Cleansing - todos clássicos), e esse lance de "influência" é a coisa mais fácil de sair do controle e se desvirtuar - vide o legado do Faith No More e seu Angel Dust.
Circle Of Snakes é um retrato do Danzig atual, e ele é bem diferente daquela banda que esculpiu hits memoráveis como Twist Of Cain, Am I Demon, Mother e Snakes Of Christ. Mas que Circle Of Snakes é uma porrada desembestada, isso é. E se você não tem problema com nego que se distancia do próprio passado então... é colocar o CD no volume 11 e esperar a casa ruir.
Tommy Victor é um mestre na guitarra, isso é fato. Ele não é o típico guitarrista hendrixiano, cheio de longos solos operísticos. Ele vive de detalhes. É um miniaturista por natureza e, sempre que pode, insere aqueles detalhezinhos que fazem toda a diferença no resultado final. E quando resolve partir pra grosseria, não tem nada igual.
O álbum começa com mais uma introdução demoníaca, dessa vez mais "instrumental" do que na intro de Luciferi. Seguem as pauladas de Skincarver e da faixa-título, e Victor mostra como se faz uma "guitarra com apito" decente. O cara é foda. Na seqüência, 1000 Devils Run. É uma porrada sensacional, mas verdade seja escrita... ela parece saída das sessões de gravação de Cleansing, do Prong. Tem até aquele ritmo pára-e-começa característico! Outro destaque é Hellmask, uma zoeira guitarrística de te fazer perder o rumo de casa. Meu amigo, que guitarra base é essa... parece um furacão! When We Were Dead tem uma pegada mais cool e viajante. Parece uma daquelas baladas pesadas do Pantera. Já Night, Besodon tem um clima tão desobediente, maléfico e infernal que dá vontade de sair por aí anunciando o fim do mundo com uma metralhadora na mão. Eu queria que o mundo acabasse com essa música rolando. A ótima Black Angel, White Angel lembra o Danzig das antigas, sempre querendo acertar um anjinho com uma bazuca.
Ao final fica a impressão que você ouviu um bom novo disco do Danzig. É um disco de guitarra, porradão, straight, pra macho. Sem o charme diabólico e bluesy dos primeiros álbuns, é verdade, mas com tudo o que se pode fazer com uma boa banda de rock moderno.
E destaque para a capa, que mostra uma espécie de Górgona bio-mecânica à H.R. Giger. Mas a ilustração não é dele não, e sim do artista Dorian Cleavenger. Pelo jeito, até os Gigers de hoje são outros.
Danzig é um aficcionado por filmes e quadrinhos de terror tão fanático quanto o Rob Zombie. Atualmente ele anda dividindo seu tempo com vários projetos, entre eles a continuação de seu álbum solo, Black Aria, dessa vez contando a história de Lilith (que teria sido a primeira esposa de Adão). Outro projeto a ser acompanhado cuidadosamente é a sua estréia como diretor. O filme Gerouge mostrará um ataque de mortos-vivos em New Orleans, possivelmente em 1854. Promissor. A história é baseada em uma HQ publicada pela sua própria editora, a Verotik Comics. Nunca li nada de lá, mas à primeira vista, o clima geral parece ser de "total liberação"... ou seja, muito sangue, violência, misticismo, sexo explícito e belezinhas afins.
Um detalhe interessante é que o carro-chefe da editora é a HQ Satanika - xará da SataNika, do blog Que Te Importa?! ... Será que a "heroína" da revista é uma homenagem? :P
Anexo 30/4
Enquanto passava o olho no texto, notei uma certa profusão do dígito 6 na tela. Juro que não é nenhuma mensagem subliminar da minha parte, mas que realmente parece obra do cão, parece.
Hum... "cão"... "dogg"... putz. :)
"If you wanna find hell with me... I can show you what it's!"