Já dizia Marceleza: "eu vi o futuro, baby... ele é passado".
Novos tempos, velhos problemas. Tive que reeditar este post, sem a música do título para audição em streaming e sem o link para download. De acordo com um polido e-mail do Blogger, uma notificação foi recebida alegando que os direitos autorais em questão foram infringidos, conforme previsto nos termos de seu DMCA. E foram infringidos mesmo, ainda que os links não representassem nada mais do que uma merecida divulgação - certamente, um ponto de vista que não interessa à gravadora da vez. De uma maneira não-lisonjeira, Terry Reid continua sendo um dos segredos mais bem guardados do rock.
Mesmo consumindo uma infinidade de grupos e artistas do final dos anos 1960 até final dos anos 1970 (época em que o rock pendurou a palheta, segundo Lester Bangs), só fui saber da existência do cantor a pouco tempo - e acredito, da mesma forma que muita gente. Foi através do filme Rejeitados pelo Diabo, que trazia nada menos que três faixas suas na trilha sonora. Todas fantásticas, mas foram os hiptonizantes créditos finais, ao som da linda Seed of Memory, que me abriram as portas da percepção. Agradecerei ao Rob Zombie ad eternum.
Guitarrista e songwriter talentoso, boa-pinta, com um vozeiraço abençoado e postura rockeira autêntica, numa época em que isso tudo bastava para virar um megastar. Mesmo assim, Terry Reid parece ter sido riscado de qualquer menção na imprensa musical dos últimos... ahn, 1975, 2010... 35 anos. A pergunta foi inevitável: onde foi que tudo deu tão errado?
Então fui à cata de algumas das (escassas) informações disponíveis sobre Reid na web. Me surpreendi com o que li. Não é uma história redentora, mas cheia daqueles tropeços épicos que mudam (pra pior) tudo o que vem a seguir. Só posso compará-lo a um Wilson Simonal da vida, no quesito "esse cara poderia ter sido grande".
Inglês de Huntingdon, nascido em 1949, montou uma banda na escola aos 15, The RedBeats. Reid chamou atenção rápido. Após uma apresentação, em 1966, o baterista do The Jaywalkers ficou tão impressionado que o convidou para integrar o grupo, já na fita para abrir para o Rolling Stones no Royal Albert Hall. Projetado para uma carreira solo e com o 1º álbum na praça (Bang, Bang You're Terry Reid, de 1968), excursionou com Cream, Jethro Tull e Fletwood Mac, entre outros. Mas é o ano de 1969 que leva o troféu.
Fechado para abrir a turnê americana dos Stones (aquela, do fatídico Festival de Altamont), Reid declinou de uma proposta dos sonhos. Com o fim do Yardbirds, Jimmy Page o convidou para o posto de vocalista do New Yardbirds, o embrião do Led Zeppelin. Não só não aceitou, como recomendou o jovem cantor da Band of Joy, Robert Plant, que abriu um de seus shows. E tem mais.
No mesmo ano, o vocalista Rod Evans saía do Deep Purple. A primeira opção de Ritchie Blackmore & cia? Terry Reid. Novamente uma recusa, e assim seu conterrâneo Ian Gillan entrava para a História.
Reid seguiu com turnês, participações em festivais e uma trinca solo arrasadora: Terry Reid (1969), o elogiado River (1973) e, meu preferido, Seed of Memory (1976), um clássico southern enterrado fundo nas areias do tempo. Péssimos empresários, seguidas trocas de gravadora (Atlantic, Capitol e ABC), mais a fraca recepção do álbum Rogue Waves (1979) praticamente encerraram aquela etapa da carreira de Reid.
Nos anos 1980, ele trabalhou como músico de estúdio e até ensaiou um retorno em 1991, com o álbum The Driver - uma incursão AOR/hard rock artificial, melosa e inacreditavelmente tardia. O máximo que conseguiu foi emplacar a faixa Gimme Some Lovin' (cover do Spencer Davis Group) na trilha do filme Dias de Trovão. Era o fim.
Um dado interessante sobre o lance com o Deep Purple é que os primeiros discos de Terry Reid tinham influências soul e r&b num contexto muito parecido com o que o grupo inglês faria anos mais tarde, na fase Coverdale-Hughes. Um bom exemplo é a música Dean, que abre o álbum River - abaixo, numa execução matadora em Glastonbury, com direito à partilha de um Big Marley sem filtro e o calor de uma audiência bem... "despojada", no auge do paz & amor, do "make love not war", "é proibido proibir" e por aí vai.
"Dean" live at Glastonbury Fayre 1971 - Terry Reid, the first track featured in the film of the original Galstonbury Fayre. Amazing band and great vocals - joined on stage later by Linda Lewis
E é curioso como o mesmo Blogger/Google que embarreirou os serviços de outra empresa no post original, liberou a mesma faixa publicamente no YouTube. Então, lá vai, de novo, Seed of Memory.
(pelo menos, nesse meio tempo, deu pra alcançar uma garrafa de Johnnie).
Viagem.
Voltando ao "fim". Isso, em termos musicais, pode muito facilmente significar "cult". Para Terry Reid, significou o resgate de algumas canções pelas trilhas dos filmes Crimes em Wonderland e Rejeitados pelo Diabo (essa, mais que uma trilha; uma celebração e reverência).
E também o cover da sensacional Rich Kid Blues que os Raconteurs de Jack White gravaram em seu 2º disco, Consolers of the Lonely.
Mas, principalmente, os shows pequenos e intimistas que Reid tem feito nos últimos anos, onde recria seu clássico a cada noite, numa versão muito superior e embriagada na experiência de quem já viu tudo, já fez o dobro e que, certamente, não se arrepende de nada e ainda faria tudo de novo.
Uma das maiores vozes do rock, desde sempre.
Review embasbacante do show em Londres
Lost Tuneage: Terry Reid
4 comentários:
Ele canta muito... E perdeu 2 oportunidades grandes, hein? Pro cara ser convidado a entrar no Zeppelin e no Purple tem que ser muito fodão.
Baixei o SEED OF MEMORY quando do post original. Vou atrás dos outros.
Abraço!
Pois é. Na verdade, Reid, Plant, Keith Richards, os caras do Purple... eram todos amigos, convivendo juntos "na efervescência da Swinging London". Natural que um passasse trampos pro outro de vez em quando, mas que essas duas propostas foram de ouro, isso foram.
Como escrito na matéria da Lost Tuneage, Reid deve ter passado os anos seguintes fritando o cérebro com cenários imaginários do tipo "E se...?"
Tenho todos os discos. Qualquer coisa, é só dar um toque.
Todos os abraços do mundo para Rob Zombie pela bela homenagem (pelas três, na verdade) em Rejeitados pelo Diabo.
Tá certo que recusar trampos no Led Zeppelin e Deep Purple é algo que nos dias de hoje parece loucura, mas na época nem tanto, afinal nenhuma das bandas gozava do prestigio que atingiram anos depois...
fora q obras-primas, tais como esse maravilhoso Seed of Memory talvez nem existissem...
e sobre sua última frase, tens toda razão, Reid é uma das maiores vozes que o rock já viu!!!
parabéns pelo belíssimo texto, passaste a limpo a carreira de grande músico!!!
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