quarta-feira, 18 de agosto de 2021

Antologia, eu quero uma pra viver


Sempre curti antologias. Material DC-Marvel adequado —fruto de seu zeitgeist, emblemático, antológico— tem de sobra. Estivéssemos em um cenário econômico minimamente decente, estaria me refestelando nas investidas da Panini pela linha. Mas já que a editora segue esnobando o apelo fácil das Archive/Epic gringas em favor do couché com capa dura deluxão de 150 minions, lá vai o infeliz aqui submeter boa parte do checklist a uma triagem de fazer inveja ao exército espartano. Tempos desesperados.

Vez ou outra surgem algumas surpresas, como a supimpa mini Batman/Huntress: Cry for Blood, de Greg Rucka, ensanduichada no meio da improvável Arlequina e as Aves de Rapina: Antologia. Vê se pode e que Deus abençoe o Guia dos Quadrinhos.

No caso da Liga da Justiça, renderia uma série de antologias, fácil. Em particular, da Liga pré-Crise, em sua maior parte ainda criminosamente inédita por estas bandas (os drops "clássicos" que fecham os volumes da salgadeira Eaglemoss não contam). Então, Liga da Justiça: Antologia serve sobretudo como um paliativo neste worst case scenario, além de um arquivo razoavelmente compreensivo. Claro que não dá pra mastigar e cuspir 60 anos de cronologia assim, na loucura. Mas é bem divertida a viagem de classe econômica desde a The Brave and the Bold #28 inicial, com breves escalas na Era de Bronze e na Liga tosca até os bad boys dos Novos 52 —sim, estou falando de você, Clark.

E esta Antologia também me trouxe um impacto pessoal extra: a inclusão da 200ª edição de Justice League of America, de março de 1982. Ou melhor, da "Superdimensionada, Estrelada 200ª Edição de... ★★★★★ Liga da Justiça da América ★★★★★", como se rasgavam na chamadinha de capa.

E que capa.


George Pérez é um dos filhos da puta mais talentosos que a indústria dos quadrinhos já pariu. E aqui, sua presença cheirava como a melhor novidade dos comics regulares desde sei lá quando. Nem era realmente uma novidade, mas Pérez finalmente desenhando a Liga da Justiça, apesar de já ter experimentado isso numa aventura dos Novos Titãs, pra mim, era como um big evento. E, inadvertidamente, era mesmo, já que aquele foi o canto do cisne do artista no título.

A própria Liga me soava como algo novo e excitante. Em 1986, ainda molequinho e já sem 1 tostão, tinha que escolher cuidadosamente o que iria levar da banquinha. Não era raro conhecer tardiamente alguns medalhões das HQs. Às vezes, o destino conspirava a favor e meu 1º contato pra valer com os Superamigos de papel foi em grande estilo: Super Powers #3, da Abril. Essa li e reli até gastar.

A aventura "Uma Liga Dividida" é hors concours em listas de melhores histórias da equipe em todos os tempos. E na minha também. Na trama, os novos integrantes da Liga são atacados pelos membros originais, que aparentemente não têm nenhuma memória sobre eles. Seu objetivo é reunir os sete meteoritos onde estão os candidatos à soberania de Appellax, planeta dos mesmos aliens que eles enfrentaram em plena Era de Prata (se morda de inveja, Grant Morrison) e que, olha o spoiler, agora os mantêm sob domínio mental. Os fragmentos estão espalhados ao redor do globo —Índico, Zimbábue, Irlanda, Itália, Ilha Paraíso— e aí tem início aquilo que mais fazia a alegria do povão nerd da época: super-herói versus super-herói. Yay!

Não era uma história complexa, tampouco original —é mais ou menos uma versão DC da clássica Vingadores X Defensores, de nove anos antes— e nem creio que este tenha sido o intento do roteirista Gerry Conway, àquela altura titular na Liga por 50 edições. Ao confrontar duas gerações de heróis, Conway exalta todo aquele simbolismo heróico/libertário/inspirador que a superequipe projeta como nenhuma outra, aspecto este que havia sofrido um desgaste natural com o passar dos anos. O foco era revitalização.

Naquele período, as edições comemorativas haviam se tornado um filão interessante para as editoras. E por mais que a Marvel tenha produzido especiais memoráveis como Fantastic Four #200 (nov/1978), Amazing Spider-Man #200 (jan/1980), Thor #300 (out/1980) e Avengers #200 (out/1980 —hmmm, essa talvez não...), ninguém sabia fazer uma festa como a DC. Em JLA #200, a editora reuniu um cast inacreditável para ilustrar as porradarias super-heroísticas.

Temos aí Pat Broderick fazendo Ajax/Caçador de Marte/J'onn J'onnz vs. Nuclear, Jim Aparo com Aquaman vs. Tornado Vermelho, Dick Giordano em Mulher-Maravilha vs. Zatanna, Gil Kane com Lanterna Verde vs. Elektron, Carmine Infantino em Flash vs. Homem-Elástico, Brian Bolland com Batman vs. Arqueiro Verde & Canário Negro e o mestre Joe Kubert desenhando Superman vs. Gavião Negro.

Como se vê, uma escalação privilegiando criadores, como Kubert-Gavião Katar Hol e Kane-Elektron/Lanterna Hal Jordan, e artistas regulares de longa data, como Aparo-Aquaman e Broderick-Nuclear. A exceção é o british Brian Bolland, recém-saído da 2000 AD, em seu 3º trabalho para uma arte interna da DC. A maior parte das artes-finais é feita pelos próprios desenhistas, menos Pérez, finalizado por Brett Breeding, os segmentos de Broderick, por Terry Austin, e de Infantino, a cargo do grande Frank Giacoia.

O resultado é o crème de la crème de la crème de la crème...





É a 1ª vez que essa história é republicada por aqui desde aquela jurássica Super Powers —sabe-se lá por que catso a Panini só incluiu o prólogo com a origem resumida da Liga na Coleção DC 70 Anos 5 de 6. Logo que bati o olho na seleção, meu coração pútrido e nostálgico quase saltou pela boca. Finalmente estava próximo de colocar minhas garras nessa história em formato integral. Aquele infame "chuunf" cocainômano pelas páginas pós-retirada de plástico estava mais próximo do que jamais esteve...

...ou quase.

Só pra não perder o costume, na 1ª tiragem do volume, a Panini chutou o pênalti direto pra Lua. Simplesmente confundiram a edição JLA #5 (maio/1997) constante no índice e nos créditos da contracapa com Justice League #5 (setembro/1987). A primeira é da fase de Grant Morrison e do Superman elétrico, enquanto a última é a Liguinha de Keith Giffen e J.M. DeMatteis, já representada no encadernado pela edição #1.

E lá fui esperar recall, mais uns meses até uma nova tiragem, solicitar o código de postagem-reversal russa, redigir cartinha explicando a peraltice da editora, empacotar tudo com cuidado, me dirigir até uma agência dos Correios e sentir a espinha congelando com a porrada que a atendente deu com o pacote na quina do balcão. E este foi mais um oferecimento do meu, do seu, do nosso...


★★★★★ Porra, Panini!® ★★★★★


Ainda tive que segurar a abstinência por mais algumas semanas até aquele chuunf restaurador (por isso não faço vídeo unboxing, seria quase tão constrangedor quanto manter um blog hoje). Mas enfim, a nova edição chegou corrigida brand new.

Agora posso viajar sem interferências TOCquísticas pelo desenho estrutural do Satélite da Liga. Melhor base.



E, claro, ver o que o Azulão (literalmente) contava de novo naquele restinho de século e com direito a Batzuada.



Por sinal, essa foi a estreia do Superômi 220V na minha coleção física. Demorei só o necessário.




No fim, tudo deu certo e o bem venceu o mal. Como na Justice League of America #200...

15 comentários:

Valdemar Morais disse...

Outra resenha foda, Doggma!

Infelizmente eu também tô salivando por essas antologias, mas ainda não tive como despender o faz-me-rir sem verter lágrimas de sangue. Ouvi por aí que a do Morcego é muito boa também e que a dos X-Men e a do Wolverine não fazem jus aos personagens. Assim que adquirir outra da série, não deixe de expôr seu parecer.

E outra: desencana que ter blog, ainda mais um tão rico como o seu, não tem nada de constrangedor! Valeu!

doggma disse...

Opa, vou incluir essa do Bátima na lista para "avaliação". O dos mutunas e do Carcaju nem considerei, visto que já tenho muito material picado. Certamente terá repeteco. Vou conferir depois.

Brigadão, Valdemar!

VAM! disse...

VAM talking from the moon...

A bem da verdade a Antologia das Aves de Rapina, não pode ser chamada de Antologia, convenhamos. Afinal, se o conceito da série é publicar histórias emblemáticas que mostrem a evolução e a representação gráfica dos personagens envolvidos, isso ela não faz.

Mas que se dane o batismo que deram pra engambelar as massas DCnianas, o importante é pegar "Sede de Sangue" com desconto, ao invés de pagar o preço cheio reajustado da Eaglemoss e de quebra ainda curtir mais duas histórias.

- - -

Quanto a JLA #200 essa é uma que ainda pretendo reler em formato gringo, porém não por essa antologia.

... ending transmission*

doggma disse...

VAM!, meu sonho de consumo mesmo é a edição comemorativa original em inglês, formatuda e com a capa dupla. Se encontra até barato no eBay...

https://www.ebay.com/itm/174755417121

...porém com frete em torno de 300 mangos!

♤ ♤ ♤

Fico imaginando se o objetivo do editor da Antologia era puxar o tapete da Eaglemoss ou foi só falta de pesquisa (e criatividade) mesmo. Tanto a Canário quanto a Caçadora e a Arlequina têm material individual de sobra. Mas preferiu encaixar 1 aventura, 1 mini e 1 anual, que ficava mais fácil. Putz.

Aquele amplexo!

Marcelo Andrade disse...

SAlve Dogma!
Vou reler algumas edições...esse post mexeu nas entranhas...
Abraço e otima semana!

VAM! disse...

É... então, me refiro a essa mesma.

Ela junto com algumas outras edições comemorativas, como Batman #400, Superman #400 estão na minha lista de futuras aquisições à uma galáxia de distância...

JLAbraços!

doggma disse...

Fala, Marcelo!

Na esteira do post, também parei para dar uma relida/viajada numas edições antigas. E a PILHA de leitura pira!

Abração!

⚡ ⚡ ⚡ ⚡ ⚡

Putz, VAM!, agora você me tentou com essas edições... Preciso de uma dose de HTV #100 e duas de CA #100 pra cair na realidade.

Abra100's!

Anônimo disse...

Agora desmembra as páginas e escaneia pra nóis

doggma disse...

Pra já. Vou abrir um Patreon e botar num pdf com senha só para inscritos, pode ser?

Do Vale disse...

Dia desses tava comentado com um certo Escapista que a Liga do Morrison deve retornar em um Omnibus por aqui...

Nem reclamo mais, SÓ QUERO QUE VENHA.

Abraço!

Obs: Sempre de olho no aguardo de postagens novas o/

doggma disse...

Busão da Liga do Morrison é algo absolutamente urgente e necessário, mesmo com as graves implicações financeiro-ergonômicas.

E quer saber? Mal acabei de fechar Lobo Solitário, já comecei Ken Parker, pela Mythos. Chutei o balde longe.

Abração!

lendo à bessa disse...

Ken Parker tá no banho-maria por um tempo, MAS TÁ LÁ. Essas Lendas e Sagas tudo de uma vez me quebraram.

doggma disse...

Putz, cara, tá foda mesmo. Mas quando saiu pela Vecchi era muito guri, depois perdi pela Tapejara e pela Mythos da 1ª vez. Dessa vez não perco esse trem por nada. Até porquê, quando algo da Mythos sai de catálogo, já era. Estou cortando umas coisas pra encaixar, mas vale a pena.

Sem contar que tá sendo legal demais ver os mercenários do CLUQ tomando na tarraqueta. No inferno tem um sex-room exclusivo pra quem lança Ken Parker e cobra 100 mangos por 144 páginas (isso há dois anos).

Do Vale disse...

E vamos de Saga da Liga da Justiça, como diz o outro.

doggma disse...

É saganagem com o bol$o do cristão...