Tempos atrás eu achava que George A. Romero seria mais um a figurar naquela longa lista de cineastas visionários, de apelo populista e quase totalmente esquecidos - como Mario Bava, Lucio Fulci, Dario Argento, José Mojica Marins, Abel Ferrara e tantos outros. Seu estilo antevia em algumas décadas vários elementos que viriam a ser reutilizados incansavelmente em produções posteriores, e que transcendiam o mero conceito de horror movie: o reencontro do ser humano com a sua própria natureza selvagem e sendo levado pelas circunstâncias de uma situação-limite, o caos iminente e sempre inesperado que derruba facilmente padrões de civilização milenares tão sólidos quanto um isopor, e eventos extraordinários violentando nosso mundinho seguro com conseqüências dolorosamente realistas. Tudo sob o olhar de uma terceira pessoa, tão atordoada quanto os personagens, o que nos coloca em um estado intrínseco de desespero, incredulidade e desamparo emocional. O equivalente psicológico à um soco na boca do estômago.
Uma das coisas mais legais sobre Romero é que o entendimento da sua arte tem uma fonte inequívoca e definitiva. Talvez seja essa a forma mais simplista de resumir a sua clássica "trilogia living-dead": A Noite dos Mortos-Vivos (1968),O Despertar dos Mortos (1978) e O Dia dos Mortos (1985). Não sei até onde eles foram prejudiciais em sua carreira (e provavelmente foram), mas esses filmes se tornaram referências imediatas não só no gênero terror, mas também de vários aspectos da narrativa cinematográfica. Estão lá a trágica condição humana, a Essência do Mal, ressequida, irreprimível e de origem desconhecida (e algumas centenas de analogias embutidas aí), e o clima de desordem urbana. Romero fazia horror sociológico.
Lembro da primeira vez que assisti A Noite dos Mortos-Vivos... deliciosamente em p&b, o ataque das criaturas lembrava muito um violento conflito de rua, com policiais de um lado e protestantes do outro. Anarquia geral. O clima de perturbação social - caótico por si só - se tornava congelante quando se percebia que um dos lados não era, ou não era mais, humano. A sensação era de que algo deu muito errado e que agora estamos pagando na forma de uma extinção lenta e simbolicamente fúnebre.
Acidente químico, biológico, nuclear? ...Juízo Final? Nunca se soube o motivo, pois Romero nunca revelou. Que continue assim.
Uma das partes mais interessantes do trailer de Land Of The Dead - o novo filme de Romero e que dará seqüência à mitologia estabelecida - é justamente no início, com a breve referência aos filmes anteriores. Totalmente sem redenções (marca registrada e meio cruel de Romero), o "universo living-dead" mostrava a podridão das criaturas se espalhando rapidamente, como se fosse uma pestilência desconhecida e fora de controle. No fim, os monstros tomaram a Terra e os poucos sobreviventes se espremiam em bunkers subterrâneos, tentando entender o caos, tentando encontrar alguma "cura" ou simplesmente tentando salvar a pele - obviamente que só adiavam o inevitável...
Pra quem assistiu aos filmes, ficou subentendido que a Humanidade foi reduzida à uma merreca de leitões prontos pro abate. Pela sinopse divulgada, em Land Of The Dead a situação parece bem mais "confortável". Os sobreviventes saíram dos claustrofóbicos bunkers para se abrigarem em fortalezas e edifícios quase impenetráveis. Entre os novos problemas está o capitalismo selvagem: os abrigos são dominados com mão-de-ferro por empresários ricos e inescrupulosos, enquanto a anarquia reina nas ruas. E a parte mais intrigante: as criaturas estão evoluindo de zumbis em slow-motion para uma "raça mais avançada".
Logo abaixo, em sentido horário: o morto-vivo que parece estar declamando "to be or not to be" tem pinta de ser o líder e já apareceu carregando uma metranca, o que é inusitado em se tratando de Romero; Tom Savini também é zumbi em Land Of The Dead. Veteranaço, ele foi o responsável pelos efeitos especiais e pela maquiagem do clássico O Despertar dos Mortos, além de ter dirigido um remake sensacional de A Noite dos Mortos-Vivos. Mas a nova geração deve conhecê-lo mais pelo seu papel em Um Drink no Inferno, de Robert Rodriguez; a musa dark Asia Argento (filha do Dario Argento, the man) quase servindo de lanche; Asia (olho nessa menina!), Simon Baker e um transeunte lá atrás, se preparando para explodir crânios apodrecidos.
O elenco principal também conta com John Leguizamo, Robert Joy e Dennis Hopper. E para os antenados... Simon Pegg e Edgar Wright fazem uma pequena participação! Eles são, respectivamente, o protagonista e o diretor do excelente Shaun Of The Dead - que Romero adorou, por sinal. Isso cria um curioso link entre influência e influenciados...
Recentemente também foi divulgado o primeiro pôster do filme (o da direita, logo abaixo). Eu achava que o pôster era esse da esquerda, mas pelo visto era só um teaser à Guerra dos Mundos. De qualquer forma, os dois são ótimos. Clique nas imagens para ampliá-las.
Land Of The Dead estréia em 24 de junho, nos EUA. Vou logo avisando: se demorar muito pra chegar aqui, vou fazer download ilegal do filme, roubar celular, carro e bolsa de madame.
Trailer 480x360 (15,5 Mb)
Na trilha: Decade Of Aggression (Live), Slayer
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