terça-feira, 2 de agosto de 2022

Guerra dos Velhos


The Old Man é daquelas séries em que a espera pelo próximo episódio é parte essencial do jogo. Os cliffhangers sutis e, ao mesmo tempo, atordoantes, deixam o espectador num abismo de incertezas, reflexões e expectativas. E assim a FX semeou sete episódios ao longo de seis nervosas semanas — ainda o melhor jeito de acompanhar uma temporada ou, ao menos, de se permitir um ângulo a mais. Adaptada do livro homônimo de Thomas Perry, a série é desenvolvida por Jonathan E. Steinberg (Jericho) e Robert Levine (Human Target) nos moldes dos thrillers de espionagem e ação da velha escola.

Na premissa, Jeff Bridges vive Dan Chase, ex-agente da CIA durante a Guerra Afegã-Soviética. Afastado há trinta anos, ele vive recluso, incógnito e tendo como companhia apenas seus dois rottweilers, além do fantasma de sua falecida esposa e da voz longínqua e quase irreal de uma suposta filha ao telefone. Um dia, um estranho invade sua casa e dá início a uma reviravolta na vida do velho operativo.

Aos mais atentos, é o mesmo plot básico do quadrinho-filme Red, de Warren Ellis, mas as semelhanças terminam aí. O que vem a seguir é um verdadeiro estudo do mecanismo de causa e efeito em perspectivas (radicalmente) diferentes. A trama cuidadosamente desvelada chega a lembrar da virada das páginas de um livro até os catárticos finais de cada capítulo. Condizente com o fato dos episódios serem intitulados laconicamente como "I", "II", "III" e por aí vai.

Steinberg e Levine roteirizam toda a 1ª temporada, que também conta a com a coprodução e direção de Jon Watts (dos últimos Homem-Aranha) nos dois primeiros episódios. O delivery Jason-Bourne-da-3ª-idade é tão certo quanto efetivo, mas é na interação de drama familiar com drama de guerra que The Old Man brilha. E não fica nada a ver à luminares como Homeland e Incêndios.

O nível do elenco é até covardia. Jeff Bridges e John Lithgow são forças da natureza. E você sabe que o negócio é bom quando, mesmo assim, ainda tem gente que rouba a cena. Leem Lubany impõe uma presença inteligente, misteriosa e, ao mesmo tempo, sensual como poucas. Difícil acreditar que a atriz palestina tenha apenas 24 anos. A ótima Alia Shawkat (a Maeby, de Arrested Development) já está na estrada há tempos e esse é provavelmente um de seus melhores momentos. Já Amy Brenneman no papel da introspectiva Zoe acaba traçando um inesperado paralelo com Eady, sua personagem em Fogo Contra Fogo. É mais ou menos como se o casal improvável que ela fez com De Niro ganhasse uma sequência imaginária com o casal que ela faz com Bridges.

E Bill Heck está espetacular no papel do jovem Bridges (e ele já havia feito muito bem o jovem Jon Voight em Ray Donovan!). Assistiria tranquilo a uma série solo ou um filme spin-off com as primeiras missões daquele "jovem Dan Chase".

Apesar de tudo isso, os percalços enfrentados pela produção não deram trégua: após o longo hiato em função da pandemia de Covid-19, Jeff Bridges foi diagnosticado com linfoma logo no reinício das filmagens. Os últimos — e excelentes — episódios quase não saíram do papel. O resultado final não apenas impressiona, como parece justiça divina — e afirmo, sem medo, que a sequência que fecha a temporada é uma genuína obra-prima dramática, narrativa, cinematográfica, fotográfica e tudo o mais. De arrepiar.

No fim das contas, Bridges se recuperou, a série é outro marco em sua carreira e a 2ª temporada já foi anunciada (e é bom mesmo!). Nada como uma trinca de boas notícias, pra variar.

5 comentários:

Do Vale disse...

Certo, mas e AQUELA análise sobre Imortal Hulk? Terminei ontem e que negócio bonito.

Preciso compartilhar impressões.

doggma disse...

Opa, me faltam ainda os dois últimos cadernos! Bom saber que o negócio se manteve "bonito".

Anônimo disse...

John Lithgow quase foi o Coringa no filme do Batman do Tim Burton, teria sido melhor que o gordo e velho já na época Jack Nicholson, John Lithgow também é bem alto ele tem 1,93 e o Coringa dos quadrinhos também é extremamente alto com 1,96 e muitas adaptações esquecem disso.

doggma disse...

Sim, tinha lido sobre isso na época, acho que na SET. Curto o Coringolson, mas realmente teria sido muito legal. Lithgow fez vilões memoráveis (e cruéis!) ao longo da carreira. É um monstro na atuação.

Anônimo disse...

Ele e o Pierce Brosnan teria sido o Batman e o Coringa perfeitos nos anos 80, mas o Tim Burton quis "inovar" escolhendo atores que não se parecem em nada os personagens dos quadrinhos.