sábado, 29 de julho de 2023

He's too old for this shit


Sempre gostei de retornos triunfais. Podia jurar que a Ordem Jedi renasceria das cinzas numa eventual sequência de Star Wars. E que a SHIELD se reorganizaria no Universo Cinematográfico Marvel uma hora ou outra. Talvez por serem instituições tão canônicas e ainda com tantas possibilidades, que parecia o óbvio próximo passo. Me lasquei nos dois casos. Os igualmente canônicos Luke Skywalker e Nicholas Joseph Fury também têm muito em comum em suas versões mais velhas e cansadas. Aliás, cansadas é eufemismo... exaustas.

Invasão Secreta tem o objetivo de amarrar uma ponta solta deixada por Capitã Marvel: a situação Skrull. Prato cheio para analogias à manipulação da opinião pública e à geopolítica atual, com a Guerra Fria 2.0 e a crise global de refugiados. E consegue, na medida do possível para um produto Disney+. Nestes termos, surpreende uma minissérie com tantos tons cinzentos, torturas e mortes. O sangue – seja vermelho ou roxo – jorra sem cerimônia. E isso é ótimo. Mas não o suficiente.

Criada por Kyle Bradstreet e dirigida por Ali Selim, Invasão Secreta mostra Nick Fury e Talos lidando com um grupo terrorista Skrull liderado pelo ex-aliado Gravik. Ao seu lado, estão dezenas (centenas?) de Skrulls revoltados pela promessa não cumprida de reassentamento de sua espécie após 20 longos anos de espera. As semelhanças com os quadrinhos são apenas incidentais. Mesmo o plot pouco lembra o material original, de escopo vastamente maior.

Nas HQs, a saga de Brian Michael Bendis não era lá aquelas coisas, a despeito da construção interessante e da genial ação de marketing da Marvel – tudo foi bem até as derrapadas e inconsistências estourando nas páginas do ato final. Na série que abre a Fase 5 do MCU, sem o contingente de personagens do 1ª escalão e completamente despida do elemento cronológico, a maior parte das boas intenções ficou só no papel pisa-brite. Mas ainda escaparam algumas.

Nick Fury autoexilado na estação espacial S.A.B.R.E. foi um bom paliativo. Justifica muita coisa que passou sem o seu crivo no pós-Blip. O que deve soar grego para quem não acompanhou as séries e filmes da Fase 4. Outra sacada simples e bacana é a base dos terroristas Skrulls localizada numa usina nuclear russa abandonada e com altos níveis de radiação – da qual eles são naturalmente imunes.

E se não tem o Super-Skull Kl'rt (o original, com os poderes do Quarteto Fantástico), nem Rl'nnd (o Super-Skrull com os poderes dos X-Men), tem lá uma nova variação de Super-Skrull com os poderes de vários heróis dos filmes. Maior, melhor, mais rápido... você conhece o esquema.

A série cria um bom slow burn e mexe em alguns vespeiros do mundo real, especialmente em se tratando da terra de Putin, o Terrível. O elenco é afiadíssimo. Olivia Colman e Ben Mendelsohn, respectivamente Sonya Falsworth e Talos, matam a pau, literal e figurativamente. E têm muito menos tempo de tela do que eles e os espectadores mereciam. E boa estreia da Emilia Clarke no papel de G'iah, filha de Talos. Já o Gravik de Kingsley Ben-Adir é puro niilismo e tensão masculina. As referências do núcleo são os thrillers que misturam drama e espionagem, particularmente filmes sobre as ações do IRA ou do ETA durante os anos 1970/1980. Era só substituir os Skrulls por informantes e agentes infiltrados e voilá.

Uma pena que o roteiro a 10 mãos opte por decisões controversas, como as mortes estúpidas de dois personagens marcantes. Certamente para enxugar o elenco do MCU para as vindouras etapas. E não ajuda o fato de que as poucas sequências de ação sejam mal concebidas e incrivelmente mal filmadas. A do ataque à comitiva presidencial numa estrada é péssima.

Mas o que pesa mesmo é o grande astro da série.


Daquela sagacidade e energia habitual do Samuel L. Jackson dos primeiros filmes como o superespião caolho, sobrou pouco. Um tanto pela própria trama, com a proposta de um Fury ol' dog e relapso enfrentando pecados do passado (ou pecados pretéritos, à moda HQ). E outro tanto, me parece, pelo próprio L. Jackson, desmotivado e exaurido no papel, talvez ciente de que o melhor da festa já passou. Isso fica nítido quando ele divide as cenas com o Don Cheadle exercitando estilo furyosamente num take alternativo de seu James Rhodes.

No fim, quando Fury ascende mais uma vez aos céus (olha o spoiler do final) soa quase como um alívio. Ou uma aposentadoria merecida.

Ps: e, como bom aposentado, o pepino que ele deixou para trás é monumental...

4 comentários:

Anônimo disse...

Não sei o que esperar dessa nova fase do MCU. Até agora nem um filme ou série me empolgou, com exceção de GG3. Mas essa esperança de ver alguns de meus personagens favoritos no cinema ainda me faz gastar meu rico dinheirinho.

doggma disse...

Tô na mesma. Se bem que adoraria ver adaptados o Comando Selvagem, os Invasores, os personagens da Charlton, da Atlas... o que é praticamente impossível.

Tenho uma teoria de que a Marvel apostava no Chadwick Booseman para preencher os lugares deixados por Chris Evans e Downey Jr. e sua morte deixou esses planos de pernas pro ar. O que temos hoje, com essa sensação de buraco gigantesco e sem rumo das Fases 4 e 5, é o resultado direto disso.

Abração e ótima semana.

Sandro Cavallote disse...

Esse lance do Boseman eu também fiquei pensando durante um tempo. E pensei que amarrariam com o Estranho, mas também ficou bem solto.

Tô na torcida, mas a Disney parece estar mais preocupada com as bilheterias do que com as histórias a serem contadas. Por mais óbvio que seja, ainda assim me entristece um pouco. Talvez a reorganização disso tudo venha com o Quarteto, mas acho pouco provável.

doggma disse...

Se não conseguirem arrumar a casa com o Quarteto (ou os X-Men), é melhor fechar o boteco de vez.

Tenho alguma expectativa por As Marvels, da Nia DaCosta. Essa é uma diretora com uma assinatura bem autoral.

E curioso pelo Blade, do Yann Demange (do excelente '71). Mas só em 2025...