Sempre gostei de retornos triunfais. Podia jurar que a Ordem Jedi renasceria das cinzas numa eventual sequência de
Star Wars. E que a
SHIELD se reorganizaria no
Universo Cinematográfico Marvel uma hora ou outra. Talvez por serem instituições tão canônicas e ainda com tantas possibilidades, que parecia o óbvio próximo passo. Me lasquei nos dois casos. Os igualmente canônicos Luke Skywalker e
Nicholas Joseph Fury também têm muito em comum em suas versões mais velhas e cansadas. Aliás, cansadas é eufemismo...
exaustas.
Invasão Secreta tem o objetivo de amarrar uma ponta solta deixada por
Capitã Marvel: a situação
Skrull. Prato cheio para analogias à manipulação da opinião pública e à geopolítica atual, com a Guerra Fria 2.0 e a crise global de refugiados. E consegue, na medida do possível para um produto
Disney+. Nestes termos, surpreende uma minissérie com tantos tons cinzentos, torturas e mortes. O sangue – seja vermelho ou roxo – jorra sem cerimônia. E isso é ótimo. Mas não o suficiente.
Criada por
Kyle Bradstreet e dirigida por
Ali Selim,
Invasão Secreta mostra Nick Fury e
Talos lidando com um grupo terrorista Skrull liderado pelo ex-aliado
Gravik. Ao seu lado, estão dezenas (centenas?) de Skrulls revoltados pela promessa não cumprida de reassentamento de sua espécie após 20 longos anos de espera. As semelhanças com os quadrinhos são apenas incidentais. Mesmo o plot pouco lembra o material original, de escopo vastamente maior.
Nas HQs, a saga de
Brian Michael Bendis não era lá aquelas coisas, a despeito da construção interessante e da
genial ação de marketing da Marvel – tudo foi bem até as derrapadas e inconsistências estourando nas páginas do ato final. Na série que abre a
Fase 5 do MCU, sem o contingente de personagens do 1ª escalão e completamente despida do elemento cronológico, a maior parte das boas intenções ficou só no papel pisa-brite. Mas ainda escaparam algumas.
Nick Fury autoexilado na estação espacial
S.A.B.R.E. foi um bom paliativo. Justifica muita coisa que passou sem o seu crivo no pós-
Blip. O que deve soar grego para quem não acompanhou as séries e filmes da Fase 4. Outra sacada simples e bacana é a base dos terroristas Skrulls localizada numa usina nuclear russa abandonada e com altos níveis de radiação – da qual eles são naturalmente imunes.
E se não tem o
Super-Skull Kl'
rt (o original, com os poderes do Quarteto Fantástico), nem
Rl'
nnd (o Super-Skrull com os poderes dos X-Men), tem lá uma nova variação de Super-Skrull com os poderes de vários heróis dos filmes. Maior, melhor, mais rápido... você conhece o esquema.
A série cria um bom
slow burn e mexe em alguns vespeiros do mundo real, especialmente em se tratando da terra de Putin, o Terrível. O elenco é afiadíssimo.
Olivia Colman e
Ben Mendelsohn, respectivamente
Sonya Falsworth e Talos, matam a pau, literal e figurativamente. E têm muito menos tempo de tela do que eles e os espectadores mereciam. E boa estreia da
Emilia Clarke no papel de
G'
iah, filha de Talos. Já o Gravik de
Kingsley Ben-Adir é puro niilismo e tensão masculina. As referências do núcleo são os thrillers que misturam drama e espionagem, particularmente filmes sobre as ações do IRA ou do ETA durante os anos 1970/1980. Era só substituir os Skrulls por informantes e agentes infiltrados e
voilá.
Uma pena que o roteiro a
10 mãos opte por decisões controversas, como as mortes estúpidas de dois personagens marcantes. Certamente para enxugar o elenco do MCU para as vindouras etapas. E não ajuda o fato de que as poucas sequências de ação sejam mal concebidas e incrivelmente mal filmadas. A do ataque à comitiva presidencial numa estrada é péssima.
Mas o que pesa mesmo é o grande astro da série.
Daquela sagacidade e energia habitual do
Samuel L. Jackson dos primeiros filmes como o superespião caolho, sobrou pouco. Um tanto pela própria trama, com a proposta de um Fury
ol' dog e relapso enfrentando pecados do passado (ou
pecados pretéritos, à moda HQ). E outro tanto, me parece, pelo próprio L. Jackson, desmotivado e exaurido no papel, talvez ciente de que o melhor da festa já passou. Isso fica nítido quando ele divide as cenas com o
Don Cheadle exercitando estilo
furyosamente num take alternativo de seu
James Rhodes.
No fim, quando Fury ascende mais uma vez aos céus (olha o spoiler do final) soa quase como um alívio. Ou uma aposentadoria merecida.
Ps: e, como bom aposentado, o pepino que ele deixou para trás é monumental...