quarta-feira, 1 de setembro de 2004

QUERIA VER SE FOSSE COM O TRAVIS BICKLE


Se antes de assistir Colateral (Collateral, 2004), você quiser tomar um choppzinho de leve, esqueça. Tome um whisky, um martini, ou qualquer drink que possa levar on the rocks no sobrenome. Isso aqui não é Michael Bay, nem Simon West, nem Jan De Bont. Isso aqui é Michael Mann, man. Puro e sem gelo. Nada de baixaria gratuita na telona. Tenha em mente conceitos como urbanidade, vida noturna, decadence avec élegance e mundo-cão. Tudo realizado com muita classe e sem se importar com a urgência da geração MTV.

Mann não faz só "filmes para adultos". Ele faz "filmes para adultos inteligentes". Com a experiência adquirida em seus anos no memorável Miami Vice, e dono de um talento nato para thrillers policiais, Mann só escorregou uma vez em sua filmografia, no filme Ali (mas pô, eu ainda estava sob o efeito dos filmaços Quando Éramos Reis e Don King, O Rei do Boxe – ainda insuperáveis na área).


Adepto das peregrinações noturnas de Martin Scorcese, Mann foca suas lentes no vasto e solitário palco da noite metropolitana. O filme retrata um dia na vida de Max (o ótimo Jamie Foxx, foda desde Um Domingo Qualquer), um taxista pobretão, honesto, gente-boa, e que sonha em "brasileiro": ele encara o trampo como temporário, até ter grana suficiente pra montar o próprio negócio – e aí, vão-se os dias, meses e anos, sempre atrás do volante. Numa das corridas, ele é sorteado pelo assassino profissional Vincent (Tom Cruise, tentando, tentando) para ser o seu chofer enquanto ele vai "trabalhando". Max - sempre hesitante e refém das suas próprias limitações - e Vincent - sofisticado e ousado por natureza e profissão - são aparentemente dois extremos. A diferença entre as personalidades e motivações é explorada até eles surpreendentemente se identificarem.

Particularmente, eu sempre gostei da linha narrativa adotada por Colateral. A ação "em tempo real", durante a noite de uma grande metrópole, já rendeu bons filmes, como Uma Jogada do Destino e Depois de Horas, do próprio Scorcese. A diversidade oferecida pela locação urbanóide é de uma realidade acachapante. As áreas suburbanas se emendam na selva de pedra, com seus modernos arranha-céus, avenidas largas e vazias, bares decadentes e boates lotadas. A noite é solitária, mesmo quando se está rodeado de pessoas. Hoje, o individualismo é extremo e as relações interpessoais estão falidas, o que foi muito bem captado pela câmera (digital) de Michael Mann.


Apesar dessas observações mais sociais, o filme não se prende à isso e traz boas seqüências de ação, como na boate onde se encontra um dos alvos de Vincent. E traz também seqüências inusitadas, como no momento em que Max vai conhecer Felix (o grande Javier Bardem), empregador de Vincent. A cena em que Vincent conhece a mãe de Max também é responsável por um momento bastante insólito, pra dizer o mínimo. Achei meio forçado no começo, mas mudei de opinião ao ver o desenrolar da situação.

Talvez pelo roteiro (de Stuart Beattie, de Piratas do Caribe) não tão à altura do talento individual do diretor, pode-se isolar, com tranqüilidade, as melhores cenas do filme: o diálogo pra lá de delicioso entre Annie (Jada Pinkett-Smith, cada dia mais bonita e melhor atriz – maldito Will) e Max é do tipo que eu gostaria de ter umas dez vezes ao dia, a social cool as ice no single bar, com Max, Vincent, o jazzman Daniel e Miles Davis (a conversa foi tão bacana que eu bato uma aposta que ele estava lá), e o clima pré-tiroteio ao som da bela Shadow On The Sun, do Audioslave.


Apenas um porém causa um efeito colateral em Colateral (nossa, péssima): o destino reservado ao policial Fanning (o ótimo Mark Ruffalo). O trabalho do cara foi tão bom que a decepção com o roteiro foi inevitável.

Pra finalizar, o vencedor foi Jamie Foxx. Construir um personagem enfraquecido que depois se fortalece, como ele fez, é muito difícil. Já o Tom Cruise é um bom ator, do tipo que detona o sparring, mas na hora da luta de verdade, ganha por pontos. É a herança adquirida por pérolas como Cocktail, Top Gun e Dias de Trovão. Se ele não ganhou o Oscar de melhor ator por Nascido em 4 de Julho, e o de ator coadjuvante por Magnólia, aí não já não tem muito mais o quê fazer. O jeito é ralar por mais alguns anos e tentar ficar mais feio pra convencer os feiosos da Academia.


Não esperem ver em Colateral a velocidade non-sense de um videoclip. Michael Mann é cool. Ele fala, você cala a boca e escuta. Se você não gosta da dinâmica estilosa e cadenciada dele, vá assistir à MTV e não me encha o raio do saco. Michael Mann é bróder.

Anexo 02/09:
Se assistir propaganda durante uma sessão de cinema já é revoltante, imagina então ver a mesma propaganda duas vezes seguidas. Foi o que fizeram com um spot anti-pirataria que anda veiculando incessantemente pelos cinemas. Os caras devem estar desesperados pra chegar à esse ponto. Com uma edição rápida e trilha moderninha, o vídeo faz o estilão MTV de marketagem, e é até bem-feitinho. Tão bem-feito que em mim, particularmente, surtiu o efeito contrário. Após vê-lo, me bateu uma vontade incontrolável de baixar algum filme na web.


60 POSTS!


Seguindo a onda das "conquistas"... mas sem o glamour de um Blogs of Note (mesmo porquê, não sou mais de lá), nem de um contador registrando o milionésimo acesso (mesmo porquê, não tenho um contador - e sim, estou sendo despeitado :P).

Esse número é quase surreal visto que retomei o blog há pouco tempo e eu caio no rock praticamente todo santo dia. Agora, por exemplo... é pra onde estou indo. Mas deu tempo de postar antes. Conclusão: os posts do Black Zombie sobrevivem no underground do meu cotidiano. BZ é rock independente!

Hasta la vista!

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