domingo, 5 de janeiro de 2014

Zombie de Ouro 2013


E vamos à listinha da ressaca anual, o Zombie de Ouro 2013. Num período em que elevei minhas técnicas de esquiva contra memes supermassivos ao nível Super-Shaolin de Aço, acumulei mais material pra conferir do que de fato conferi. A internet abriu todas as comportas da cultura pop e as pessoas, por sua vez, querem mostrar o que andaram criando - mesmo que nem tenham terminado de criar. O tempo hoje é escasso tanto pro criador quanto pro público, então priorizar virou a ordem do dia. O que isso pode trazer de consequências negativas (além, é claro, dessa ininterrupta rave de informação) ainda vamos descobrir. Teorias não faltam.

Antes, uma nota em homenagem à Alvin Lee, Clive Burr, Ray Manzarek, J.J. Cale, Jeff Hanneman e Lou Reed, alguns dos grandes da música que fizeram suas passagens em 2013. E no cinema, Jess Franco, Roger Ebert, Ray Harryhausen, Dennis Farina, James Gandolfini, Peter O'Toole e Paul Walker. Pessoas que, de uma forma ou de outra, deixaram as suas marcas neste mundo - e vão continuar deixando nos tempos que virão.

De todas as listas de melhores discos, essa foi a mais, digamos, selecionada. Não há nenhum filler (aproveitando um jargão da indústria musical), e me doeu excluir artistas que curto, mas que lançaram álbuns apenas medianos. Fora os outros tantos que eu simplesmente ainda não tive tempo de ouvir ou de assimilar apropriadamente.

Mas vamos nessa, que 2014 já começou a mil por hora!






EU VOLTEI, AGORA PRA FICAR


Mesmo sem Bill Ward, 13 é provavelmente o mais próximo de álbum clássico do Black Sabbath em pelo menos 40 anos. A química não só ainda existe, como está mais poderosa (que monstro dos riffs é esse Iommi), inventiva (que linhas de baixo [e texto] do Geezer) e filha da puta (ah, Ozzy) do que nunca. Se for o último mesmo, God bless you all. Esse foi digno daqueles quatro cabeludos de Birmingham sem um puto no bolso e cheios de ideias malucas na cabeça.



Do auto-exílio e dos rumores sobre problemas sérios de saúde a um espetacular comeback, com direito a um dos álbuns (e vídeos) mais comentados do ano. Só David Bowie mesmo. Parece que fez só pra calar a boca dos pobres mortais e dar mais uma provinha de seus poderes ilimitados dentro do panteão pop. Musicalmente, The Next Day se situa em algum ponto entre Scary Monsters (and Super Creeps) e Let's Dance. Só o climão da faixa "Love is Lost" (a irmã mais nova e gótica de "Cat People (Putting Out Fire)") já fez valer a espera.



De todos os retornos ultra-aguardados, o do My Bloody Valentine parecia o mais improvável. Quase uma lenda urbana. Com sua taxa frenética de 1 álbum/década e uma mística genuinamente alternativa, a impressão era de que os irlandeses iriam cozinhar esse caldo indefinidamente, em nome do status cult. Mas eis que voltaram com a formação clássica e um disco que honra o legado dos icônicos Isn't Anything (1988) e Loveless (1991).
m b v soa mesmo como uma sequência natural de Loveless, mais atmosférico e shoegazer. Isso se explica pelo fato de que o figura Kevin Shield começou a compor o disco em 1996 (!). Se o delay foi devido a problemas técnicos (acho que não) ou bloqueio de autor (acho que sim) não importa. O que importa é que o resultado foi excepcional. E isso ao vivo deve ser uma imersão num ofurô cheio de Santo Daime sem hora pra sair.



Ok, sempre fui apaixonado pela Hope Sandoval. Eu beijo o chão que ela pisa. E esperava por um disco novo do Mazzy Star desde... pô, desde o último, Among My Swan, de 1996. Então sou suspeito pra elogiar ou recomendar Seasons of Your Day. Mas, por Vênus, que disco intoxicantemente delicioso. O dark/atmospheric/dream pop perfeito do grupo está com texturas mais acústicas e rústicas, incluindo até ocasionais slides (vide "Spoon" e "Flying Low") e aquela aura décadence avec élégance que faria Lana Del Rey desistir de sua pseudo-melancolia e ir vender sanduíche natural em Arraial D'Ajuda.


Menção honrosa: Magic Hour (Luscious Jackson)



I WANT TO BREAK FREE


The Raven That Refused to Sing (And Other Stories) é o 3º solo do músico Steven Wilson, frontman do Porcupine Tree. E como o fruto não cai muito longe da árvore (perdão, não resisti), o que se ouve é um autêntico som progressivo com doses de fusion. Mas sem chatices virtuosas com trocentas escalas pentatônicas - e se há em algum nível, é sempre em favor do lirismo, da música. A banda é genial, e as faixas têm arranjos incríveis e repletos de detalhes que, sozinhos, justificam atenciosas audições nos fones de ouvido. Como se não bastasse, o disco tem um conceito meio Neil Gaimaniano e cada faixa conta uma história envolvendo de alguma maneira o sobrenatural - o lindo vídeo de "Drive Home" dá uma boa ideia da atmosfera. É um álbum realmente especial que merecia ser descoberto fora de seu fandom.


Menção honrosa: The Winery Dogs (The Winery Dogs)



BIG WHEELS KEEP ON TURNING


Seasick Steve nunca saiu do meu playlist desde que conheci o sujeito. E o novo disco, Hubcap Music, tratou de estender essa "parceria" por mais alguns anos. Muitas coisas mudaram para Steve desde então. Outras não. Mesmo colecionando discos de ouro e platina, ele continua fiel às suas origens. A capa e o título do álbum - literalmente "música de calota" (de carro) - é um bom exemplo de sua atitude, digamos, autossustentável, felizmente com excelentes resultados. E na banda ainda estão os mesmos Dan Magnusson e o mestre de obras-primas John Paul Jones. Jack White toca guitarra na música "The Way I Do". E os caras do Sigur Rós empurram o carro de Steve quando não quer pegar. Todos estão a serviço do hobo!


Menções honrosas: Wrote a Song for Everyone (John Fogerty), Foreverly (Billie Joe Armstrong & Norah Jones)



PAID THE COST TO BE THE BOSS


Tão simples que parece fácil, mas não é não: é genial. AOR é um tributo apaixonado de Ed Motta ao adult oriented rock - mais especificamente ao West Coast AOR, cujo perfeccionismo e sofisticação foram tão disseminados por grupos como Hall & Oates, Spandau Ballet e, especialmente, o grande Steely Dan. De fato, AOR parece herdeiro direto não apenas do Dan, mas também do disco The Nightfly, o excepcional debut solo de seu co-fundador, Donald Fagen. Melhor referência, impossível. Há poucos artistas vivos no Brasil capazes de visitar essa sonoridade com o nível que lhe é característico. E Ed Motta está no topo da lista.



Em 2013, o desconhecido soulman Charles Bradley pegou todo mundo no contrapé com uma antológica versão de "Changes", do Black Sabbath. O que foi uma promoção de luxo para seu segundo disco, o excelente Victim of Love. Funk, soul e r&b de primeira. Clássico e moderno ao mesmo tempo.



BOING · BOOM · TSCHAK


É possível atingir o novo sob uma visão retrô? Se Random Access Memories não responde essa questão, não sei o que conseguiria. O duo francês Daft Punk não apenas manteve o alto nível de sua discografia (incluindo aí a fantástica trilha de Tron: Legacy) , como quebrou uma porção de paradigminhas que vinham se arrastando décadas afora: que disco é um subgênero de baixa qualidade, que artistas da música eletrônica não são músicos de verdade, que o pop precisa ser pedestre pra ser popular e por aí vai. Com o álbum, eles fizeram o "dever de ca$a" com a estourada "Get Lucky" (além da coleção de joias pop que a acompanha). Mas o ouro mesmo é a faixa "Giorgio by Moroder", uma obra de arte áudio/biográfica em homenagem ao veterano produtor italiano. Sozinha, a música já vale o disco, a banda, a carreira.



Curioso ver grupos seminais como o Depeche Mode administrando o boom revivalista dos anos 80. Pra eles, basta voltar às raízes. Ao exemplo do The Human League (que lançou um bom álbum nesses moldes em 2011), o trio Martin Gore, Dave Gahan e Andy Fletcher abraça sem pudor a synthplicidade dos primeiros álbuns pós-Speak & Spell. Mas a tarimba e a carga emocional são de raposas velhas. Delta Machine traz texturas melódicas no auge da refinação e Gahan está cantando como nunca - vide a belíssima "Heaven" e o bluesão eletrônico "Slow", na melhor tradição do DM. Trent Reznor deve ter ficado horas debaixo do chuveiro em posição fetal se perguntando como eles conseguem. E Nicolas Winding Refn mataria Ryan Gosling com um elmo viking para ter uma dessas canções em algum filme seu.



Gary Numan fez o que o Nine Inch Nails não fez em 2013. Em Splinter (Songs From A Broken Mind) o pioneiro synth britânico mostra que é a sombra por trás de cada músico que já olhou pra um sintetizador com cara de pervertido. Ok, ok, o mesmo vale para Kraftwerk, Silver Apples, Devo, Suicide, a türma do kraut rock... mas no ramo de injetar electronices e esquisitices na seara pop é ele quem responde. Ainda. Em Splinter, Gary está mais atual do que nunca - e mais Numan do que nunca também.


Menções honrosas: Kunst (KMFDM), LowCityRain (LowCityRain)



21st SCHIZOID MEN


Pra mim, "OddfellowS" é o melhor álbum do Tomahawk. Pronto, escrevi. O som atual parece um mix das bandas mais famosas dos integrantes Duane Denison (The Jesus Lizard), Trevor Dunn (Mr. Bungle), John Stainer (Helmet) e, claro, Mike Patton (Fenemê). Em algumas faixas, soa como se todas elas se juntassem para dar sua versão para o rock de FM. E se eu fosse o dono de uma, tocaria esse disco até furar.



Lydia Lunch é uma cultuada personalidade no wave do submundo nova-iorquino. Cantora, compositora e escritora, ela já trabalhou com vários dos grandes transgressores da cena alternativa, de Sonic Youth e Jim "Foetus" Thirlwell ao Einstürzende Neubauten. Seu atual grupo, o Big Sexy Noise, dá continuidade aos seus projetos bizarros, sempre longe do esquemão e das amarras do gosto popular. Dessa vez, a parceria é com integrantes do sensacional grupo londrino Gallon Drunk - o guitarrista James Johnston, o saxofonista e organista Terry Edwards e o baterista Ian White. O resultado é uma massa sonora pesada, ganchuda, com um pé na garagem e outro no jazz, com um senso melódico sombrio, algo sarcástico (cortesia do timbre meio Marianne Faithfull da voz de Lydia). É o Black Sabbath, se fosse banda de cabaré vagabundo em New Orleans.

O duplo Collision Course & Trust the Witch traz uma performance ao vivo na Itália em 2011 e o terceiro álbum do grupo, lançado no mesmo ano. O que sugere até certa estabilidade em se tratando da inquieta Lydia. Tomara que essa piração dure por mais alguns discos.

Site oficial (com som, NSFW)



Em One One One, o Shining está naquela calmaria. Ainda mais comparando com o álbum anterior, o psicótico Blackjazz. É como se o Napalm Death de repente virasse o Foo Fighters. Mesmo assim, a índole hostil do grupo norueguês segue imutável: free jazz, noise rock, heavy metal, industrial e King Crimson sendo batidos num gigantesco colisor de hádrons operando no limite. Só que agora dá até pra assobiar as melodias, espia só. Coisa de maluco e pra maluco.



O trio californiano Death Grips começou a chamar atenção com o incendiário mixtape Exmilitary, de 2011. O som é inclassificável - convencionou-se chamar de hip-hop experimental, o que não dá a noção exata, já que o trip hop de um Tricky, por exemplo, já fazia um delivery similar, mas nem de longe tão minimalista, caótico e niilista. O novo disco, Government Plates, é exatamente isso. É sonoridade fim-da-linha, catártica e impondo uma experiência completamente individual de assimilação. Digo sem medo de errar que serão os mesmos 0,01% de fugitivos do hospício a voltarem dessa lobotomia sonora pedindo bis.


Menções honrosas: Ultraviolet (Kylesa), Pain is Beauty (Chelsea Wolfe)



THE DEVIL SENDS THE BEAST WITH WRATH


Ao lado do Back Sabbath, o Carcass deu uma aula de como se grava um álbum de reunião de alto nível. E da mesma forma que o quarteto de Birmingham, o quarteto de Liverpool também teve que encarar o estúdio desfalcado de um jogador importante. Felizmente, os ícones do metal extremo não foram lá pra perder viagem: Surgical Steel é um destruidor álbum de death metal com aquele mix de técnica absurda e as rebuscadas nuances melódicas em que o Carcass fez escola, para o bem e para o mal. Só não é melhor que o insuperável Heartwork - mas justiça seja feita, o disco ainda precisa envelhecer alguns anos para que a comparação seja feita com o devido equilíbrio. Por hora, cuidado com qualquer mosh ao som de Surgical Steel. Vai ser sanguinário.



O hype e as juras de amor não foram à toa. The Wild Hunt, do trio sueco Watain, transcendeu a violência over-the-top unidimensional das formações black metal escandinavas. Debaixo daquela saraivada infernal de acordes encontram-se influências atípicas de noise rock, shoegazer e até pós-punk, com bases espertas que inovam no louvor ao capeta. O grupo usa até o silêncio, como num bom filme de horror. Aliás, as letras são puro satanismo trash, com rituais demoníacos de sacrifícios de bebês ("The Child Must Die"), odes à Sauron ("Black Flames March"), fanfics de Evil Dead ("Sleepless Evil") e outras delicadezas tão sapecas quanto.

Geralmente, antes de elogiar qualquer banda viking/pagan/black metal, dou um baculejo virtual nos meliantes pra checar se são simpatizantes neo-nazi arrombados, mas pelo que li, os Watain-boys são barra-limpa. Inclusive o baixista chileno Alvaro Lillo, que atua nos shows, ainda respira, então acho que tá tudo ok.



Gosto de muita coisa do Sepultura com o Derrick Green nos vocais. Mas acho que o guitarrista Andreas Kisser, franco líder do grupo, ainda não atingiu a sonoridade que tanto persegue, gerando resultados irregulares ao lado de ideias refrescantes e promissoras. The Mediator Between Head and Hands Must Be the Heart (ufa) tem o nível mais alto de acertos do Sepultura da fase Green. Não sei se pela produção casca-grossa de Ross Robinson (de Roots), se pela performance explosiva do prodígio Eloy Casagrande ou se porque o... coração dos caras estava no lugar certo. Ainda não chegaram lá, mas o que o Sepultura é hoje está bonito de ver. E de ouvir.



Se nos últimos discos o Voivod andou taxiando em pistas stoner e punk, Target Earth marcou seu retorno ao thrash progressivo/space/jazzy em tempo integral. O guitarrista Daniel "Chewy" Mongrain realmente deve ter ouvido muito o grupo na fase Nothingface, visto que o estilo e até o timbre que utilizou são os mesmos eternizados pelo saudoso Denis "Piggy" D'Amour. Uma homenagem muito bem-vinda. Mais um álbum espetacular de uma banda, ainda, única.

Site oficial (com som, NSFW)



O veterano Genocídio tem conseguido encaixar uma sequência bacana de álbuns, sem tantos hiatos entre eles (ainda que fossem Hiatus...). No excelente In Love with Hatred a banda do mítico W. Perna se afasta um pouco das influências vanguardistas e pós-punk da fase Posthumous em favor do aspecto thrash-death-doom clássico. Isso feito por quem conhece do riscado, é garantia de headbanging desenfreado. Um álbum direto e pungente que poderia inspirar quem só sabe reclamar da "cena", do público e da falta de apoio ao metzzzz...


Menções honrosas: Diabolic (Accu§er), The Dream Calls for Blood (Death Angel), Colored Sands (Gorguts)



WE ARE MOTÖRHEAD


Em 2013 Lemmy deu uma apavorada na geral com uma baqueada estranha na saúde. Parece que a coisa foi séria, muito embora o Motörhead tenha roncado furiosamente em Aftershock. É um álbum que tem um pouco de tudo pra todos: rock 'n' roll do puro, rockões quase hardcore, rockões quase thrash, blues pesados (ah, a maravilha que é "Lost Woman Blues"), hards com aqueles grooves malvadões e até um baladão southern estradeiro como só os brutos são capazes de fazer ("Dust and Glass", fabulosa). Ainda ouço Aftershock quase todo dia, tocando febrilmente a minha Rickenbaker imaginária...



PUNK'S NOT DEAD I KNOW


Jello Biafra and the Guantanamo School of Medicine é a nova piração hardcore do lendário Jello Biafra. O som é uma batida de frente entre Dead Kennedys e o Lard sem a tralha high-tech. Já o cinismo e o humor negro continuam corrosivos ao extremo. White People and the Damage Done (título sensacional!) é o 2º disco do grupo e mostra toda a virulência do cancioneiro Biafrano. Suas letras são de mijar de rir - a de "Shock-U-Py" é um primor - e, ao mesmo tempo, o discurso é uma coturnada na boca. O melhor HC que ouvi em 2013.


Menções honrosas: True North (Bad Religion), 13 (Suicidal Tendencies)



KICK OUT THE JAMS, MOTHERFUCKER


Full On, da banda The Freeks, foi uma das grandes surpresas do ano. Em suas fileiras estão ex-integrantes do Fu Manchu, Nebula e Roadsaw - ou seja, só craques na distorção desembestada. Curto e grosso, o som do quinteto remete à energia primal de bandas como MC5, The Stooges e New York Dolls, devidamente atualizada e acrescida de algumas doses de anfetamina. Um puta fuzz-fest.



A maleta com o 1 milhão de dólares do Mudhoney ficou mesmo pelo caminho. Por algum motivo, eles nunca deram um tempo nas atividades para colher os louros que só a fama cult é capaz de trazer. Acho que estavam mais preocupados em continuar gravando ótimos discos no mesmo esquema quase-underground desde sempre. E Vanishing Point é daqueles ótimos com um plus no final. Pra mim, é o melhor deles lançado neste século. Esse é pra ouvir com o volume no talo.



Vista Chino é a nova banda de John Garcia e Brant Bjork, respectivamente o vocalista e o baterista do cultuado Kyuss. Essa dupla é uma verdadeira instituição do stoner e do heavy psicodélico e, salvo alguns projetos sazonais lá e acolá, já eram considerados desaparecidos em combate. Peace, o disco de estreia, veio pra mudar um pouco esse cenário - com a ajuda do baixista Nick Oliveri (também ex-Kyuss, ex-Queens of the Stone Age e já saído do Chino após as gravações). Não é foda como o Kyuss. Mas o grupo nem quer isso: apesar de algumas porradas na boa e velha escola, a parada aqui é menos Sabá no deserto e mais acid rock na garagem. Saca as jams hipnóticas da JPT Scare Band? É por aí. Os moleques cresceram...



Soponcio é uma surpreendente banda de Valparaíso, Chile. Nos papos de release e divulgação, o trio lista influências de grupos como Kyuss, QotSA e Truckfighters. Mas apesar do sangue stoner realmente correr pelas veias do grupo, o que esse 2º álbum homônimo realmente lembra é um In Utero latino. Isso mesmo, o In Utero, do Nirvana, desde os acordes barulhentos conduzindo a linha melódica e os vocais esgoelados (em bom espanhol) até os valores de produção "Albinianos", com bateria e guitarra mixadas bem na cara. Um belíssimo disco de rock visceral. E disponível no Bandcamp da banda no esquema pague-quanto-quiser-e-se-quiser. Del carajo!


Menções honrosas: Sound City: Real to Reel (The Sound City Players), Defcon 5... 4... 3... 2... 1 (Man or Astro-Man?)



CHILDREN OF TODAY ARE CHILDREN OF THE GRAVE


Se houve um reflexo negativo do retorno do Black Sabbath com o monumental 13, foi a sombra eclíptica que gerou sobre outros grandes lançamentos do estilo que criaram. E entre todos, o mais prejudicado foi o antológico The Last Spire, da veterana banda inglesa Cathedral. Antológico por dois motivos: primeiro, é um monolito negro que reúne toda a carga sonora acumulada pelo grupo em 24 anos de estrada - portanto temos aí uma sensacional viagem pelo doom metal com nuances góticas, progressivas e psicodélicas; segundo, é o álbum de despedida de Lee Dorrian, Garry Jennings & cia., que já fecharam os portões dessa Cathedral no momento em que escrevo isto. Um canto do cisne negro digno da história da banda. Sem dúvida, os melhores alunos do Sabbath original. Vida longa e próspera.



Uma pintura esse The Mouths of Madness, segundo disco do quarteto californiano Orchid. O som está ainda mais intenso em seu mix de doom, blues rock, rifferama Iommica à beira de um processo de direitos autorais e até uma vibração meio dark sixties à The Doors (talvez pelas intervenções sutis, mas espirituosas, de teclados e harmônica). Não dá pra pensar em algo melhor pra ouvir numa estrada empoeirada dentro de um Maverick invocado.



'Desperate Souls of Tortured Times', estreia do quarteto londrino Age of Taurus, é outro registro que reflete os melhores aspectos da herança do Black Sabbath. Doom metal por natureza, mas em sua versão mais palatável, com pitadas stoner conferindo um certo arranque e influência do lado mais macabro da NWOBHM representado por bandas como Witchfinder General e Holocaust - especialmente nos vocais do barbudão Toby W. Wright. Peso de classe.



Abra Kadavar é o segundo álbum do trio alemão Kadavar e vem sedimentando sua boa fama nos círculos especializados em retro-rock. As impressões gerais e o próprio release vendem um parentesco com o kraut e com formações clássicas do occult rock, mas no geral a coisa puxa mais pro hard blues progressivo, na cola do Wishbone Ash e Ten Years After. O peso, contudo, é massivo. Claro, não tem como não notar algumas safadezas dos germânicos: a quebra rítmica no meio da faixa de abertura, "Come Back to Life" é quase sampleada de "Gypsy", do Uriah Heep, o riff de "Doomsday Machine" aprendeu a ser assim com o riff de "Victim of Changes", clássico do Judas Priest, e por aí vai. Felizmente, isso não tira o brilho do álbum (só pega emprestado). Afinal, tradição por tradição, temos aí um looongo histórico de "coincidências" no Livro do Rock...



Sina é o segundo disco do power duo sergipano The Baggios. O som é uma rendição ao hard lisérgico, com influências que vão de Led e Grand Funk até Secos & Molhados. O sotaque carregado dos vocais conduzindo levadas mastodônticas de guitarra e bateria é um negócio acachapante. Esses caras deviam tocar em estádios lotados, com motoqueiros fazendo a segurança e groupies pagando peitinho. É fácil um dos melhores grupos de rock 'n' roll nacional da atualidade. E o álbum ainda está disponível de grátis no site oficial:

http://site.thebaggios.com.br/

Mas vê se compra. Esse vale, vale, vale...



O grupo pernambucano Anjo Gabriel já tinha surpreendido meio mundo com o discaço O Culto Secreto do Anjo Gabriel, de 2011. Sua música é cheia de trips percussivas multiculturais, riffs sabbáthicos, space rock à Hawkwind e até elementos do Pink Floyd doidão e genial dos primeiros dias. Lucifer Rising é mais ou menos o certificado ISO-666 do bando. No álbum, eles dão sua versão para a trilha sonora do filme homônimo dirigido pelo Kenneth Anger - uma história à parte que, entre outras coisas, teve a trilha oficial assinada por Bobby Beausoleil, um dos seguidores assassinos de Charles Manson, e uma trilha original composta por Jimmy Page e apenas lançada em 2012. Agora é a vez do Anjo Gabriel louvar a Ascensão de Lúcifer em dois faixões Lado A-Lado B. Como nos velhos tempos. É só pra quem pode. E conhece.



Uma coisa dá pra afirmar com certeza sobre Infestissumam: quem detesta o Ghost continuará detestando, mas que quem curtiu o primeiro disco vai poder chafurdar nessa brincadeira por mais algum tempo. Esses últimos também adoram a mise-en-scène de horror B, as capas-paródia, o som de guitarra limpinho-quase-glam, as covers nonsense e a influência bem administrada do King Diamond. A bença, Papa Emeritus II.



If You Have Ghost só reafirma o que foi escrito antes. A começar pela capa, uma gracinha, até as covers de "I'm a Marionette" (ABBA), "Crucified" (Army of Lovers), "Waiting for the Night" (Depeche Mode) e, pra acender uma vela, "If You Have Ghost" (Rocky Erickson). O EPzinho sombrio mais pop e ensolarado que já ouvi.


Menções honrosas: Last Patrol (Monster Magnet), Moons in Penumbra (Sheavy), Indigo Meadow (The Black Angels), Back To Land (Wooden Shjips)



FILME DO ANO


Com um pé nas costas e em Gravidade zero.


Menções honrosas: Antes da Meia-Noite, Os Escolhidos, Invocação do Mal, A Caça (2012)



MELHOR DOC MUSICAL VISTO EM 2013


Searching for Sugar Man, de 2012. Uma história-quase-fábula das mais surpreendentes e emocionantes da música pop.



MELHORES HQS


Revival é uma intrigante série de Tim Seeley que parece um encontro entre Arquivo X e Twin Peaks. Saga traz a espetacular parceria entre Brian K. Vaughan e Fiona Staples em uma espécie de underground marginal do universo de Star Wars. Pra quem quiser sair da mesmice e se aventurar por territórios estranhos e atraentes, ambas são imperdíveis.

(Ao que consta, Saga será publicada no Brasil pela Devir)


Menção honrosa: Supurbia, minissérie de 2012 (pelo inusitado da proposta)



MELHOR SÉRIE DE TV ADAPTADA DE HQ


Arrow nem de longe é perfeito, mas sabe que o caminho mais curto entre dois pontos (no caso, o espectador e a satisfação) é uma linha reta.



SÉRIE DE TV ADAPTADA DE HQ MAIS DECEPCIONANTE SOBRE AGENTES DA SHIELD


Agentes da SHIELD. O incrível é eles têm tudo, orçamento, bons atores, ideias (uma Casa delas)... mas a dinâmica juvenil e a falta de ousadia predomina. Só assisto pelo agente Coulson - Clark Gregg é o cara - e pelas SHIELDzetes.


Por enquanto é só, pessoal. Reações, adições, subtrações, discussões e correções nos comentários.

4 comentários:

Adelvan disse...

Grande lista, excelentes textos! quando eu crescer quero escrever como você ...

samurai disse...

Como sempre lista fodastica.
Esse som do Daft Punk...pqp.

O Ed Mota...genio !

Incluiria o 2013 Rock and Roll Hall of Fame induction do Rush.
Alex discursando...blah blah

Meu velho Grande 2014 pra vc e sua familia !

Abraços
Alessandro

Luwig disse...

Jesus, como me sinto aliviado agora em perceber que não sou o único psicopata que está achando Arrow um programinha simpático. É bem verdade que sinto falta do Ollie cafona-comuna-beatnik, mas sete infernos, é o que tem pra hoje.

Revival, você já havia cantado a bola pra mim, e valeu a leitura. Muito bom. Após o hiato criativo de Brian K. Vaughan pós-Y/Ex Machina, Saga foi a única série sci-fi na História dos quadrinhos a fazer o percurso de Kessel em menos de 12 parsecs!

Mas...

Por que diabos Fury Max de Ennis & Parlov não está nessa maldita lista? Vá lá, faça sua retificação, eu espero, até os zumbis têm o direito de errar.

Aquelas três últimas edições (#10-13) foram sucessivos Roundhouse kicks na boca do estômago!

"Às vezes a farda te fode de volta!"

Genial! Pra posteridade!

Abração.

Luwig disse...

Digo... quatro últimas edições.

Aproveitando a oportunidade, também não entendo como algo assim passou abaixo do radar do Eisner Awards e demais premiações. Minha Guerra Se Foi é Ennis operando na mais alta qualidade e Parlov alçado ao nível de mestre da arte sequencial.