Alvejado por uma de suas próprias flechas (disparada por dois junkies sem qualquer habilidade e em plena crise de abstinência), Oliver Queen, o Arqueiro Verde, se depara com um desafio muito pior do que os supervilões que estava acostumado a enfrentar: o tráfico de drogas. Dessa vez, o Mal não vinha dos confins do Universo ou de outra dimensão. O Mal agora era interior e contava com tantas nuances que tornava a sua resolução praticamente impossível. Para auxiliá-lo nessa verdadeira bad trip, o herói e amigo pessoal Hal Jordan, o Lanterna Verde, em sua concepção da Era de Prata - não por acaso, sua melhor fase.
E assim começava o arco O Pranto dos Pássaros Feridos/A Morte Cresce Dentro de Mim, publicada no Brasil na edição #4 da saudosa Superamigos e uma das melhores e mais atemporais histórias já concebidas nos quadrinhos. Um clássico da abençoada dupla Dennis O'Neil/Neal Adams. Quando eu classifico essa fase de "atemporal" não é à toa. Longe do maniqueísmo e escapismo tradicionais, o roteiro corajoso de O'Neil colocava os heróis enfrentando não vilões, mas pessoas reais, com todos os erros e acertos comuns a qualquer um.
Inteligentemente, os heróis também "sofriam" com os efeitos da realidade e, não raro, demonstravam falhas de caráter e cometiam erros de julgamento. Isso sem falar da temática barra-pesada, muito à frente de seu tempo e sem o glamour familiar das HQs. Já a arte clássica de Adams, além de ser um colírio visual, exibia uma técnica estilosa, bem-acabada e muito acima da média, mesmo para os dias de hoje. Aliás, principalmente para os dias de hoje, infectados por poses sexistas e músculos inexistentes na anatomia humana.
Tudo isso em uma história publicada originalmente em 1971 (!).
Às vezes eu fico com um pouco de receio de ser tachado de saudosista, mas relendo histórias antigas e com esse nível de qualidade, é impossível ficar impassível (putz). A perfeição mora nos detalhes, e até o formato de quadrinhização foi utilizado por Adams como uma ferramenta. Esse trecho, por exemplo, fala por si só. Para ilustrar a dor do Arqueiro ao levar um soco no braço machucado, ele driblou a falta de espaço com uma classe impecável. Conseguiu passar o sentimento surpresa-reação-dor-impotência em apenas um quadrinho fragmentado em sentido descendente. Perfeito.
Isso pode parecer simples (e até é - as melhores idéias não são as mais simples?), mas se fosse nos dias de hoje, qualquer Liefeld ou Bagley da vida transformaria esse mero quadrinho numa página dupla central e ainda assim não conseguiria transmitir a mensagem.
Outra sacada de mestre e característica principal da fase O'Neil/Adams. Mesmo habituados a enfrentar ameaças de porte incomensurável, ao lado da Liga da Justiça ou em suas aventuras solo, tanto o Lanterna como o Arqueiro encontravam as maiores dificuldades ao lidar com o "real". Seus dons acabavam sendo anulados pelo fato de que não há somente o bom e o mau. Na prática não é tão simples, e o uso dos poderes e habilidades ficavam extremamente restritos, pois não havia um "alvo" pré-definido.
Esse momento é bastante ilustrativo. Após a ajuda voluntária de um viciado "que não agüentava mais o seu vício", eles acabam sendo traídos pelo mesmo, que não suportou sequer olhar para o seu traficante sem querer se drogar novamente. Com apenas um golpe, ele pôs abaixo o Lanterna Verde, um dos maiores pesos-pesados das HQs. Irônico e trágico ao mesmo tempo. E genial também.
Até então, Ricardito era só mais um ajudante de Papai Noe... ops, de super-herói. Ele era um sub-Dick/Bucky travado, situação que piorava pelo fato de que o próprio Arqueiro (seu "patrão") sempre foi relegado à condição de coadjuvante. Mas nas idéias e mãos hábeis de O'Neil/Adams, Ricardito adquiriu mais dimensão que muito super-herói de destaque por aí. De bom moço aspirante a herói teen, ele se tornou um... drogadito (putz²) - talvez o primeiro personagem de HQ a passar por uma barra dessa. E bem debaixo da barbicha do Arqueiro, o que lhe rendeu um dos acessos de fúria mais singulares dos quadrinhos. Essa cena é clássica, sem dúvida uma das mais marcantes da história da nona arte.
Drogadi... digo, Ricardito, recebeu de O'Neil um senhor precedente para grandes histórias no futuro. Pense em Tony Stark, o Homem de Ferro, e seu onipresente fantasma do alcoolismo. Com Ricardito seria parecido, mas muito mais intenso, devido à ilegalidade do objeto de seu vício. Infelizmente, num belo equívoco editorial, o personagem ficou abandonado após essa fase, limitado a fazer pontas (sem trocadilhos!) nas entressafras das aventuras principais dos Novos Titãs.
Em novembro de 2000, a DC resgatou essa fase memorável de O'Neil/Adams à frente da revista Green Lantern/Green Arrow, através da série DC Archive Editions. The Green Lantern/Green Arrow Collection, trazia toda essa fase num encadernado de capa dura e 368 páginas. Seria um belo presente de Natal, não fosse o preço sanguinolento: US$ 75,00 (!).
Mais recentemente (setembro último), a editora Opera Graphica resolveu entrar na brincadeira e lançou Lanterna Verde e Arqueiro Verde: Sem Destino, um álbum que contém duas histórias dessa fase: ...E Uma Criança Irá Destruí-lo e Um Mundo Feito de Plástico, ambas inéditas por aqui (essa Abril Jovem...). Agora, as más notícias: o álbum traz apenas 64 páginas à 'módicos' R$ 19,90.
Tudo bem que as histórias primavam pelo "realismo", mas isso não precisava chegar até o preço...
Link:
Excelente matéria sobre a fase O'Neil/Adams, escrita por Rafael Lima, no Sobrecarga
Não sou tão entusiasta assim de animês, com exceção dos tour-de-force habituais do gênero (tipo Akira, Ghost In The Shell, Cowboy Be-Bop, Metropolis, etc.). Mas o estilo sempre me agradou - e muito - pela dinâmica e fluidez. Além do quê, o anime é uma clara representação da cultura japonesa moderna, repleta de inovação e tecnologia, e que, ao mesmo tempo, reverencia sua cultura milenar. É, talvez, o choque "velho/novo" mais harmonioso de toda a cultura pop contemporânea, com a grande vantagem de trazer um raro conhecimento de causa - coisa que o filme A Viagem de Chihiro realizou com maestria ímpar. Pra falar a verdade, até que eu saco um pouco de animês, sim...
E Quentin Tarantino também, ao inserir aquela antológica seqüência animada em Kill Bill. O mérito pela grande idéia é todo dele, já o mérito pela eficiência técnica vai pra Production IG, a empresa responsável pela inspirada animação. Para quem (como eu) ficou querendo mais daquele anime session surrealista, o Linkin Park (banda que eu rotulo de playstation rock) resolveu embarcar na onda e contratou a Production IG pra dar um "trato" no clip da música Breaking The Habbit, do álbum Meteora.
Claro que ali foi mais timing e oportunismo barato do que genialidade propriamente dita. Mas que ficou bom pra cacete, ficou (tem até um construto igualzinho ao do filme Contato, com a Jodie Foster).
A propósito, eu não assisto à MTV... mas imagino que você já deve ter assistido esse clip no mínimo umas 4.000 vezes. Eu baixei dia desses e só vejo de vez em quando. :P
Porradaria de primeira mesmo rolava em Street Fighter 2 Victory, exibido no Brasil em 1995, pelo SBT. Num estranho (e feliz) acaso, a série estreou por aqui apenas seis meses após sua estréia no Japão. E depois de uma tenebrosa série animada americana (Street Fighter versão G.I.Joe?!), SF2V funcionou como uma espécie de catarse sensorial, devolvendo aos personagens toda aquela emoção e fúria em frente aos fliperamas, com direito a "geral" lotada. Eu já até comentei sobre isso por aqui uma vez, mas depois de reassistir à essa pérola... preciso dar vazão ao entusiasmo, e é aí que entra você, caro leitor. :)
SF2V conseguiu a proeza de criar um background, se não verossímil, ao menos aceitável, para os personagens. Na verdade, sempre houve um senso comum do que eles poderiam ser, e isso já era perceptível mesmo na velha plataforma 2D. Eu, por exemplo, nunca imaginei a Chun Li como uma vilã, ou o carniceiro Vega como um mocinho. A índole dos personagens já era subentendida, e pra saber a origem de cada um, bastava zerar o jogo (o que eu nunca consegui fazer com o desengonçado Dhalsim).
Em 29 episódios, a série era centrada em Ryu Hoshi e no playboy Ken Masters, amigos de infância e exímios lutadores. Eles se reencontram após vários anos e Ken banca uma turnê mundo afora, em busca dos maiores lutadores do planeta. E é só isso...! A premissa era básica ao extremo (como de se esperar!), mas executada tão bem, de forma tão empolgante e competente, que era impossível não se emocionar. Sem o crivo da M.P.A.A. e das zilhões de siglas de órgãos de censura norte-americanos, a Capcom (dona dos direitos do game) largou a equipe japonesa à vontade. E a pancadaria comeu solta.
Pra alegria dos fãs, SF2V era violento com força! Espirros de sangue, lacerações e ossos fraturados eram lugar-comum na série. Dificilmente seqüências gráficas como a luta entre Ken e Vega passariam pelo crivo da censura norte-americana. Os combates era muito bem tramados e "coreografados", sempre ao som de muito rock pesado e tecno. A trilha sonora de abertura, aliás, é um primor à parte, lembrando um mix do tema de Exterminador do Futuro com a pegada épica de Jerry Goldsmith (tá, exagerei um pouquinho).
Outro detalhe interessante - e relacionado à cultura japonesa - é a maneira como o sexo comparece em SF2V. A sexualidade ali é mostrada de uma forma mais natural, libertadora e até inocente (da maneira como eles o enxergam), não libidinosa e contraventora (como nós o enxergamos e na maioria dos casos, queremos). Mas calma, não existem hentais nos desenhos não. Eu me refiro apenas ao subcontexto que veio camuflado, como na cena de topless da sexy Cammy e em seu uniforme pra lá de sumário, e, principalmente, no embate/dominação entre Bison e Chun Li, onde seu vestido é reduzido a pedacinhos bem estratégicos.
Os episódios de Street Fighter 2 Victory são uma beleza de se assistir, altamente empolgantes. Pena que foi tudo muito breve. Para os incautos, recomendo uma generosa sessão de downloads no KaZaA. Todos os episódios estão lá, o que me faz agradecer à Hórus pela existência dos P2P.
Seguem uns shots, pra matar a saudade.
Ken e Ryu, treinando ainda moleques...
...e mais tarde, já adultos e batendo muito mais forte
Vega... traiçoeiro, impiedoso, ultra-violento...
...e retalhando Ken de fora a fora
O temível Bison e o misterioso artefato que lhe confere o Psycho Power
O combate final... o esperado momento do ajuste de contas...
Bison, esbanjando energia negra...
...e esfregando o chão com a cara do Ken!
Ryu, invocando o Hadouken...
...a energia primordial...
...e Bison, esperando seu primeiro desafio digno em muito tempo!
Foda, foda, foda! Já quero até assistir de novo. E como diria o slogan/grito de guerra do desenho...
dogg, que queria ganhar Lanterna Verde e Arqueiro Verde: Sem Destino de Natal, mais o DVD-Box de SF2V (um pacote natalino, na verdade!), ao som de Tornado of Souls, do CD ao vivo do Megadeth.
2 comentários:
ótimo post
só clássicos
abs!
Valeu. É um post clássico (no sentido de véio).
Abraço!
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