Num mundo perfeito, 2017 seria comemorado pelo público e editoras nacionais de quadrinhos como se fosse o aniversário de alguma grande cidade ou de algum santo padroeiro. Como sabemos, esse foi o ano do centenário de Jacob Kurtzberg (1917-1994), também conhecido como Curt Davis, Jack Curtiss, Lance Kirby (esse é ótimo), Jack Kirby. Ou simplesmente o apelido mítico que ganhou de Stan Lee: "The King".
Do fim dos anos 1950 até o fim dos anos 1970, Kirby dominava. Atualizou a estética e a dinâmica das HQs com uma fúria reformista nunca vista antes - e raríssimas vezes depois. Fez a ponte entre complexidade e simplicidade, desenvolvendo um estilo próprio que o permitia produzir páginas e páginas em ritmo industrial sem oscilar na qualidade. Nunca ninguém produziu tanto em tão pouco tempo quanto Kirby. Era praticamente um Jimmy Page dos gibis. Seu legado para as artes e para a indústria é incomparável, exercendo reflexos vívidos até hoje.
Lá fora, a artilharia Kirbyana foi incessante - não apenas neste ano comemorativo, mas nas últimas décadas. Lançamentos a todo vapor, nada sai de catálogo e a variedade de opções é impressionante. Mesmo.
Apesar disso, não é bem um cenário de reconhecimento que se vê por estas bandas atualmente, a começar por uma boa parcela dos fanboys. Já li cada bobagem sobre a arte de Kirby e ignorância sobre o contexto da época que hoje desconfio que aquelas famosas ponderações de Umberto Eco eram sobre alguns leitores de HQs. Como bem resumiu o Daniel Lopes, do Pipoca & Nanquim: "tolos".
E não ficou muito melhor com o tributo magrinho que a Panini reservou para o ano do centenário com os dois volumes de Lendas do Universo DC: Super Powers, num equívoco seletivo de dar gosto. É material inédito por aqui, certo, mas nada representativo do que foi o Rei no auge. Isso era pra ser lançado bem depois de Quarto Mundo, Kamandi, OMAC e Etrigan, o Demônio, só pra ficar na jurisdição DC. Ou, no mínimo, pra anteceder metade dessas sagas ainda em 2017.
Vão-se os centenários, ficam os importados. Se descaso é mato nessa terra, sejamos os capinadores.

O calhamaço é graúdo: além das participações no título do Hulk e da Marvel Comics Presents, as 440 páginas também trazem todas as 19 edições da série original do Machine - ou "Mister Machine", como era chamado em sua estreia oficial na quadrinhização do Rei para o clássico 2001: Uma Odisseia no Espaço, não compilada aqui por conta dos direitos que mofam ad eternum nos cofres da MGM.
E tudo bem que não se trata de um material 100% Kirby. Afinal, ele divide metade da série solo com outro criador peso-pesado - ninguém menos que o genial e genioso Steve Ditko. Excelsior!
Nada mal como uma (Almost) Complete Collection.

Uma baixa terrível, literalmente, de última hora: a substituição da capa original da The Demon #1 (set/1972), clássica e espetaculosa, por uma arte em detalhe que mais parece um flash do Etrigan com enquadramento ruim. Que o autor dessa ideia cumpra uma pena exemplar nos círculos inferiores.
E já que toquei no assunto, a Amazon anda meio salafrária ultimamente. Alguém mais encomendou aquele Cavaleiro das Trevas anunciado com capa prateada e recebeu a versão anterior, com as silhuetas do Batman e do Super?
O TPzão coleta as dezesseis edições originais de The Demon, cuja publicação atropelou os planos ambiciosos do Rei para seu xodó, a megassaga Quarto Mundo - cancelada após o sucesso nas vendas do diabão amarelo. O que, imagino, deve ter deixado Seu Kirby muito enjuriado pela sua demoníaca criação.
Deve ser a maldição do gênio da raça. Fazer o quê, se até pra
Seja como for, o capeta rimão aportou direto no quadrante 666 da coleção.
Há que se fazer a menção honrosa aos divertidíssimos The Demon vol. 1: Hell's Hitman e The Demon vol. 2: The Longest Day, com a dobradinha Garth Ennis/John McCrea imersa em insanidade e anarquia, e para The Demon: From the Darkness, de Matt Wagner e Art Nichols - provavelmente a melhor história do Etrigan já escrita.
Em outras palavras, o Demônio do Rei Kirby está em excelentes más companhias.
E o Máquina também.
5 comentários:
Confesso que os heróis queixudos não são o meu top 3 mas é realmente inegável a importância do cara.
Considerando suas contribuições pra Marvel e DC somadas é fácil perceber que ele é o cara!
Saudações imperfeitas, doggma!
Que toquem as trombetas por mais estes valorosos acréscimos em suas prateleiras, companheiro!
Mas falando nas paragens escaldantes (ou seriam congelantes?), o Rei parece ter sido punido por algum erro moral desconhecido por nós, súditos tupiniquins. Somente dessa forma encontro justificativa para o abandono de seu Legado por parte da Padaria Marvel.
E se não fosse a oportuna casualidade da Extensão Clássica Black Label®, o "equívoco seletivo" teria um gosto muito mais amargo, algo como enxofre descendo pela garganta, tenebrosamente imagino eu...
Mas assim como Kamandi, a esperança é a última que morre, quem sabe então 2018 não guarde algumas surpresas que ficaram ocultas nos anúncios da recente ConConvenção?
Grande abraço e um ótimo novo ano!
VAM!
E aí, doggma... blz?
Parabéns pela excelente e invejável postagem, rs... Mas vendo esses 2 materiais q vc selecionou do REI, a gente fica pensando: O qto a pirinini e seus editores tacanhos ainda TEM q aprenderem, hein?
Diante dessas ed. q vc mostrou... os caras ainda tiveram a ideia de começar as "homenagens" do centenário pelo "Super Powers" e AINDA estão na dúvida em "arriscarem" o "4º Mundo" (q deveria ser CERTO pra sair logo do forno)!
Tá certo, sei q estamos num mercado bastante amplo e infinitamente maior e melhor do q era até uns 10 anos atrás... MAS ainda falta TANTO pra ser o ideal, né?
Abs!
E a "esperança não morreu, ela foi ao inferno e voltou"...
É isso mesmo caro doggma, acabo de assistir pelo (YT/BlogBuster) o Arauto Levitã prenunciar a chegada do inominável amarelo, ainda esse ano dentro das Lendas UDCescas.
E caso se comprove a existência de uma horda de seguidores "compradores" Kirbyanos outras criaturas de coração maligno também poderão invadir nossas bancas, oriundas diretamente do próprio Apokolips, o planeta infernal!
Abraços escaldantes,
VAM!
E aí, Vinícius!
Seu comentário foi pertinente e perfeitamente bem fundamentado. É exatamente isso que eu tento explicar aos outros (mentira, não explico nada, mas penso, rs). Opinião crítica é uma coisa, reconhecimento é outra. Cada um curte o que quer. Contanto que saiba do que se trata. Fica mais bonito.
Existe um monte de artistas badalados que eu, pessoalmente, descurto, mas que reconheço a importância e o impacto que têm na indústria. Sem crise. Alguns eu até começo a gostar com o tempo...
Abração!
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Fala, LEO!
Concordo em absoluto... o dia em que aquele KING-SIZE KIRBY for editado por essas bandas, com certeza já estaremos oficialmente no cenário ideal, rs.
Os editores da Panini são muito obtusos. Pelo menos é o que passam para o público. Como é que a Salvat consegue vislumbrar algo como os Vingadores de Busiek/Pérez dando certo - e exclusivo pela internet! - e uma editora de grande alcance e recursos como a Panini não consegue? Que fórum ou página do Facebook esses caras andam frequentando?
Ou será que é (mais uma) jogadinha de bastidores à revelia do conhecimento público? E enquanto estamos balangando os beiços aqui, eles estão lá contando o dinheirinho entrando em caixa?
Abraço!
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Grande VAM!
Rapaz, li uns rumores sobre isso há uns dias. O que o Levi fala não se escreve, mas geralmente - geralmente - acaba saindo do papel. Ou melhor, saindo no papel. Basta ter uma saca de 15 arrobas de paciência.
Saindo, vou pegar com certeza. Prefiro muito mais o offsetão Lendas UDCístico que o pisa brite americano - que é melhor que o nosso, mas ainda pisa brite. Além do mais, tem que incentivar a coisa, né?
E Deus (e Darkseid) te ouça, meu filho!
Abraços Apokolípticos (não da novela da Record)!
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