Ainda não foi dessa vez que a bolha do mercado nacional de HQs estourou. Mas que houve uma estremecida esquisita entre o final de 2015 e este início de 2016, isso houve. E não vindo apenas das editoras, mas também da distribuição, que, por padrão, atrasa tanto quanto antecipa títulos, mas que agora parece ter batido um recorde do caos.
A programação dos lançamentos foi implacável: tijolões de Crise nas Infinitas Terras, A Saga da Fênix Negra, A Liga Extraordinária: Século e as incessantes coleções da Salvat, Eaglemoss e DeAgostini se embolando com arrobas de edições de dezembro que só há pouco aportaram em bancas e lojas. Isso sem mencionar aquisições indie fora da curva, carinhosamente garimpadas em nome de uma coleção com a cara do dono.
Resultado: janeiro foi meu mês mais $obrecarregado desde que passei a registrar a experiência. Sentei o dedo nessa porra.
O problema da quantidade deixou de ser dos mixes mensais para ser dos encadernados. Especialmente agora, com a chegada do material dito "clássico" às graphics da Salvat, onde o aproveitamento por edição foi elevado substancialmente. Histórias antes relegadas às edições adulteradas da editora Abril finalmente publicadas com acabamento digno - embora não na ordem ideal, cronológica, proposta já sepultada pelo naufrágio das linhas Biblioteca Histórica Marvel e Crônicas, da DC.
Mesmo assim o paliativo é saboroso. Quem não fazia a coleção inteira e dava graças a Crom por isso, pode passar a carteira - e já viu a extensão #11, Contos de Asgard, que coisa linda e irresistível? Bem dizia aquela máxima dos filmes: "cuidado com o que deseja".
Das editoras menores, apenas a Mythos e seus minions cantoneses parecem manter seu nicho de mercado. Muito disso é culpa de um certo ranger texano e seus, até ontem, 11 títulos regulares variando entre almanaques em formatinho preto e branco e trade paperbacks coloridos gigantes. Ele e um bárbaro cimério contam com uma vantagem sobre seus pares da 9ª arte: um público informal não segmentado que já foi mais forte em tempos idos.
E que, aliás, segue como fonte de piadinhas infames recorrentes...
O público original de Tex e Conan no Brasil
Uma das consequências imediatas desse boom quadrinhístico são os relançamentos dos títulos mais populares num curto espaço de tempo em relação à publicação original. É uma tática predatória cujo reflexo é sentido nas linhas mais baratas, como os mixes, e que não parece projetar algo positivo a longo prazo.
A base desse mercado, afinal, é o cronograma mensal, popular, não o das "edições definitivas". Do mesmo jeito que ocorre lá fora.
Mas cá estou eu com a minha coleção de Capitão América & Gavião Arqueiro fechada recentemente...
Voei perto do Sol com asas de pisa brite...
...me vendo estranhamente acostumado com a aquisição do encadernado do Clint Barton.
Mais um dia no escritório da repetição. Algo tão óbvio assim só senti com a minissérie Grandes Astros Superman e sua edição TP. E olha que elas tiveram 4 anos de gap.
Pelo menos o Cap de Rick Remender foi divertido. Será que vai ter encadernado também?
Levi Trindade, editor da Panini, não parece nem um pouco preocupado: segundo ele, a agenda de relançamentos vai seguir em ritmo industrial em 2016. Entre a avalanche de mangás e a ótima Maravilha de Brian Azzarello e Cliff Chiang, a reedição com o melhor timing periga ser a de O Imortal Punho de Ferro, da abençoada dupla Ed Brubaker/Matt Fraction.
Não apenas pela série live-action que se forma no horizonte, mas também por um dos meus exemplares de Marvel Apresenta. Das três edições onde a série foi publicada, entre 2008 e 2009, as duas últimas nunca saíram do plástico. Já a primeira...
Papel que não respira vive melhor...
Acho que isso soluciona algumas polêmicas colecionistas.
Esse post subiria no finalzinho de janeiro e foi prorrogado para o fim do Carnaval, mas não tive como deixar passar algumas coisas que foram surgindo. Principalmente porque o assunto parece bastante ligado ao tal "ritmo industrial" dos relançamentos de luxo que a Panini vem imprimindo de uns bons tempos pra cá.
Crise nas Infinitas Terras e X-Men: A Saga da Fênix Negra, sem maiores apresentações, excetuando os preços: 115 e 85 reais, respectivamente. Considerando cenário econômico, importância das obras, projeto gráfico e material extra (em especial, o de Crise), justo, muito justo. Justíssimo.
O problema é que foram dois lançamentos de grande porte evidenciando profundas deficiências de revisão da editora. Ainda não li - ou revisei, rá. Me limitei a conferir se constavam lá os erros noticiados via Facebook, YouTube, fóruns e blogs, talvez, na esperança de ser uma falha isolada a alguns lotes da gráfica. E pelo jeito, não foi.
Em A Saga da Fênix Negra já virou famosa a cena do Wolverine e suas "gatas de adamantium".
Mas o pior veio algumas páginas antes.
Terrível.
A revisão de Crise nas Infinitas Terras também "não faz feio" com dois diálogos trocados que, se não trazem nenhum prejuízo às tramas principais, no mínimo bagunçam completamente a cena.
Nada, nada, um erro que nem a Abril e suas traduções la garantia soy yo cometeram.
Questionado sobre o caso nos comentários do Distopia Cast, novamente Levi Trindade, sempre boa-praça e solícito, não desconversou e pareceu genuinamente surpreso com os erros.
Segue o trecho.
E foi isso aí.
Até posso relevar a troca dos balões de Crise - a rigor, o mesmo erro pavoroso constante em Sandman - Edição Definitiva (volume 1, pág. 343). Que é frustrante visto de modo isolado, mas que, no conjunto, não ofusca o fato de que é uma belíssima e imperdível edição. Isso se não encontrarem mais vacilos cabulosos, lógico.
Já os erros de Fênix Negra, ao meu ver, configuram com louvor os requisitos para um recall. Penso que são falhas tecnicamente bobas, porém pontuais. E traçam um cenário interno grave que só pode ser explicado pela completa ausência de revisão (que, em tese, é composta por várias etapas redundantes com mais de um profissional envolvido), possivelmente causada por contenção de gastos ou por alguma deadline ambiciosa - ou coisa pior, para os conspiradores de plantão.
Não consigo acreditar que foi apenas incompetência coletiva. Sem ironia.
Pretendo acompanhar os desdobramentos disso. Vou cornetar nos perfis da editora, cutucar por e-mail, enviar as fotos e tudo o mais. Recomendo a todos a mesma atitude. Se surtir efeito prático, também vou querer um novo corrigidinho e nos conformes. Se rolar só umas desculpinhas, bem... não vou ficar mais pobre por causa disso. Mas vou ficar mais chato.
Por hora, está inaugurada oficialmente a tag Porra, Panini! aqui no BZ.