domingo, 4 de dezembro de 2022

Bate-Man & Paulão, a dupla dinâmica!


Atualizar um título é um dos momentos mais melancólicos e nonsense da rotina de colecionar quadrinhos. Melancólico porque é um processo de desapego. É nessa hora que toda aquela magia nostálgica costuma ir pro saco. Nonsense porque, se você já tem o bendito gibi, então por que pegar uma versão nova? Entre prós e contras, existe a praticidade, os extras, a diferença das dimensões, da diagramação, do papel, da impressão e quadrinhofilias afins. A vida não é fácil.

Felizmente, também existem casos como os de Batman: Gótico. Ou Gothic, dependendo do editor.

A HQ saiu originalmente em Legends of the Dark Knight #6 a #10, entre abril e agosto de 1990. O roteiro de Grant Morrison segue uma linha detetivesca com elementos faustianos/sobrenaturais. Como de praxe no título, a trama se passa nos primeiros anos (meses?) do Cruzado Embuçado envergando o capuz. E inclui algumas patacoadas já anacrônicas para a época, como a ridiculamente-elaborada-armadilha-infalível-da-qual-o-Morcego-escapará-no-último-instante. Era o bom e velho Morrison pagando tributo ao seriado sessentista enquanto se deliciava com sua salada de cogumelos, ácido e ecstasy — o café da manhã dos campeões.

A arte trazia Klaus Janson onde não havia nenhum lápis para ele transformar em algo do Klaus Janson que não fosse o dele mesmo. Que é bem irregular, diga-se. Não duvido que tenha tascado o nanquim de primeira. Mas o emprego da retícula Zip-A-Tone ficou show de bola.

No Brasil, a história foi publicada em 5 partes na cultuada Um Conto de Batman em julho de 1991 e encadernada em dezembro do mesmo ano. A Abril estava ligeira (isso, mais a hiperinflação acabaram com minhas preten$ões de acompanhar gibizinhos naquela década). É uma delícia revisitar a obra nos dropzinhos do formato americano original. Ainda é o melhor jeito de ler quadrinhos, mas que, misteriosamente, nunca pegou por aqui.

E o melhor de tudo foi algo que só relembrei agora, atualizando para a versão em capa dura. Foi dali que saíram alguns momentos icônicos da edição nacional de quadrinhos...


Justiça seja feita, o ato de traduzir, que normalmente já é um trabalho traiçoeiro, às vezes adquire contornos demoníacos. Ainda mais quando pipoca um trocadilho intraduzível, como foi o caso deste "Bat" (de "bastão") - "Man". É sensacional, embora completamente alienígena para a nossa realidade.

Nada que a tradução nacional não desse conta com o jeitinho brasileiro na ponta da agulha.


Literalmente, o cara-que-bate. Genial é pouco.

Podia até torcer o nariz para a malandragem da "tradução localizada", não fosse o próprio nome do herói por aqui uma subversão adaptativa clássica — que ninguém liga e até agradece.

No expediente, os créditos da tradução e adaptação são do Estúdio Art & Comics, dos sócios Helcio de Carvalho, Dorival Vitor Lopes e, claro, Jotapê Martins. Este, com toda a certeza, o pai da criança.

Muito embora, ache que, diante de tal abacaxi e com os prazos batendo na canela (Um Conto era quinzenal), é bem possível que o engenhoso Jotapê tenha se inspirado em uma fonte muito louca.


A 1ª aparição de um "Bate Man", em MAD #60, da Vecchi (jun/1979)

E na edição da Panini?

A solução foi surpreendentemente sucinta.


Os créditos são dos manos Diogo Prado (tradução) e Pedro Catarino (adaptação). Faltava ao Jotapê essa contemporaneidade.

Mas sem problema. Na Gothic da Abril, os nomes originais eram meras telas em branco aguardando o talento de um artista. E esse artista era ninguém menos que João Paulo Lian Branco Martins.



Também conhecido como Jotapê Paulão.

Nessa atualizada melancólica e nonsense decidi pelo impagável e pelo sensato: vou manter as duas edições.