domingo, 15 de agosto de 2004

TUDO QUE IRENE ADLER QUERIA


Anos 60? Woodstock? Timothy Leary? Alguém...?

Só dia desses que fui ler Lúcifer - Cartas na Mesa, e o fiz em uma só tacada (3 edições). A história é daquele tipo em que não se consegue parar de ler até chegar ao fim. Leitura imprescindível tanto para seguidores veteranos de Neil Gaiman, quanto para iniciantes nesse mundo de conto de fadas punk.

O argumento surreal de Mike Carey e o belo traço de Chris Weston não deixam nada a dever aos melhores momentos da vida quadrinhística do personagem Lúcifer. Esse, aliás, é uma das personas mais bem-construídas das HQs, nível John Constantine. O cara é (muito) sacana, cruelmente humano (!), e carrega consigo toneladas de perspicácia, astúcia, lucidez e... timing. Sim, Lúcifer tem muito, muito timing. Ele só influi ou aparece na história de forma estritamente estratégica. Enfim, Lúcifer é o capeta.

Bem, leiam as revistas, pois estas merecem a sua valiosa atenção (inclusive a edição #4, que traz uma história genial chamada Nascida com os Mortos).


Essa cena lembra o clip de Sowing the Seeds of Love, do T4F

Originalmente eu ia comentar apenas sobre uma seqüência em particular: a da vingança. Em determinado momento, uma das personagens, Jill Presto, adquire poder para acessar e reposicionar todos os acontecimentos do passado e do futuro de qualquer pessoa (muito bem sacado). E, como não poderia deixar de ser, existem algumas pessoas que "merecem pagar pelo que fizeram".

Achei bem legais as possibilidades desse "poder existencialista" no plano físico. É filosofia em briga de bar. Saca só então, a vingança:


Clique na imagem

Como diria Jello Biafra: Nazi Punks... FUCK OFF!!



Operação Resgate:Quando o Texas era mais do que petróleo e dinastia Bush.


PANTERA
(1990-1997)


Os caras: Philip Anselmo (vocal), Dimebag Darrell (guitarra), Rex Brown (baixo) e Vinnie Paul (bateria).


Os discos: Cowboys from Hell (1990), Vulgar Display of Power (1992), Far Beyond Driven (1994), The Great Southern Trendkill (1996) e Official Live: 101 Proof (1997).

Foram 5 bombas nucleares despejadas no cenário musical ao longo da década de 90. O Pantera fez muito barulho, incomodou, e chegou naquele ponto em que parecia estar em vários lugares ao mesmo tempo, tamanho era o seu sucesso na época. Foram recordes e mais recordes quebrados, todos em seqüência. Mas se eu tivesse que destacar um momento em especial, eu diria que foi a estréia do álbum Vulgar Display of Power, direto em 1º lugar na parada da Billboard. Foi a primeira vez que um grupo de metal extremo alcançou tal feito, e isso arregaçou as portas do mainstream para o quarteto texano. O Pantera foi uma banda que atingiu um incrível sucesso. Incrível mesmo, seus discos venderam muito, sempre na casa dos 7 dígitos. Poderiam tranqüilamente se aposentar e ter uma casa de praia em algum país da América do Sul. Curiosamente, isso só foi acontecer após eles adotarem um estilo bem mais anti-comercial.

Desde a produção, com a bateria seca, baixo inaudível e as guitarras lá na frente, até a sua temática unidimensional (vio-vio-vio-violeeeennnce!), tudo conspirava para uma longa e produtiva vida no underground. Talvez, justamente por essa simplicidade franciscana, aliada à uma técnica instrumental irrepreensível (mas, sabiamente, sem se prestar como fator de destaque, ao contrário de bandas como Dream Theater e afins), e influências naturais de Metallica circa ...And Justice for All e Sepultura fase Arise, possa ser isolada aí aquela característica que costumamos chamar de "identidade". Por outro lado, a banda jamais perdeu aquele senso melódico, ahn, poser, que era justamente a matéria prima utilizada em álbuns pré-Cowboys. O Pantera nessa época era poser. Mas poser com força mesmo. É até surreal ver hoje alguma foto antiga do machão Dimebag, atolado em maquiagem e com aquele corte de cabelo empinado à Vince Neil, do Motley Crüe.

Muito provavelmente, seu sucesso avassalador (para os padrões do metal extremo) possa encontrar uma explicação definitiva na postura e nas letras transbordantes de ódio e individualismo. Isso, em um país como os EUA, encontra um grande respaldo por parte de um público viciado em raiva, frustração e medo. Catarses via MTV costumam funcionar muito bem por lá, e não foi só com o Pantera não.

Aspectos dicotômicos à parte, musicalmente, o Pantera foi um achado. Seu background hard rock fracassado foi quase que totalmente limado a favor de uma sonoridade metálica, carregada de influências do velho crossover oitentista (D.R.I., G.B.H., S.O.D., etc.) e um talento nato para riffs simples e certeiros - com certeza adquiridos em seus anos de laquê.


Considero que a primeira manobra de 90° na carreira do Pantera foi no Cowboys from Hell, que é o tipo do disco que agrada. É cheio de ganchos, mas sem se render à facilidade pop. Pesado, mas sem sair dos trilhos. É só ouvir belezinhas como Primal Concrete Sledge, Psycho Holiday, Heresy e a faixa-título pra você se convencer de que pode ouvir Pantera no volume 10 sem estranhar (ou se importar). Além de trazer também a magnífica Cemetery Gates, uma balada pesada com um riff tão marcante que nem o Professor X conseguiria tirar da cabeça.

Outro ponto interessante é que, com Cowboys, a banda arrebanhou legiões de fãs provindos das mais diversas tribos, de headbangers e punks até o consumidor padrão de produtos MTV, repetindo dessa forma a mesma comoção de 1983, quando o Metallica estreou com o clássico Kill'Em All.


Cowboys também foi uma excelente preparação para um dos álbuns mais singulares desse boteco chamado ROCK: Vulgar Display of Power mudou as regras das gravadoras e fez a cachoeira cair pra cima. De repente, todo mundo começava a soar como o Pantera, tanto veteranos (Overkill, Fight, do Rob Halford, e Paul Di'Anno, ex-Iron) quanto novatos (Machine Head, Misery Loves Co., Madball). Sabem aqueles discos que atingem a perfeição no que diz respeito à proposta da banda? Nos anos 90 tivemos bastante desses (pretendo comentar sobre cada um, se eu não morrer antes), e Vulgar Display of Power foi a vez do Pantera. Esse disco é daqueles em que o som se remodela conforme o volume, igual aos clássicos do AC/DC, Motörhead e Ramones. Portanto, Vulgar... só no talo.

Não há nenhum destaque específico, pois todas são a medula óssea da banda. Técnica discretamente elegante, fúria aos borbotões, viagens à base de arpejos guitarrísticos, riffs assassinos... e esse nem é o mais pesado da discografia deles. Só É o Pantera, no seu mais sincero. Para registro: Mouth For War é uma das músicas de abertura mais contundentes da História.


Ao que chegamos à porradaria cavalar de Far Beyond Driven, um disco ainda mais minimalista e experimental. A guitarra de Dimebag aqui é o destaque, e ele maltrata a coitada: distorções com o pé cravado no pedal, apitos, reverbers insandecidos e puro ruído atonal dão o tom (trocadilho sem-noção).

Pedradas boas para se ouvir durante uma revolução: Becoming, a ultra-cool 5 Minutes Alone, I'm Broken (metal playboy, ótima pra ouvir no carro), Good Friends and a Bottle of a Pills, Slaughtered e 25 Years. Far Beyond Driven também inaugura a Era das Aberturas-Avalanche: logo de cara, Strenght Beyond Strenght implode os auto-falantes e twiters dos desavisados que esqueceram o som no volume máximo. Música para despertar (e voltar a dormir só no ano que vem).

De quebra, ainda tem o cover viajante de Planet Caravan (do Black Sabbath), que cairia muito bem em um lual com um pessoalzinho na faixa e algumas substâncias. É o Pantera a serviço dos fãs.


The Great Southern Trendkill, ou "O Grande Assassino Sulista de Modismos", traz o Pantera em sua profissão de fé, ainda com a mesma sonoridade, e já ultrapassando o punk melódico e o finado grunge.

Musicalmente, parece ter saído das sessões do disco anterior, apesar de conter momentos mais introspectivos, como 10's, Suicide Note Pt. 1 e Floods (muito próxima dos climas down do Alice in Chains). A abertura, com a faixa-título, é demolidora, War Nerve tem um inusitado jeitão de hit profissional, e Sandblasted Skin com certeza deve quebrar pescoços ao vivo. Mas a vencedora é a carniceira Suicide Note Pt. 2, muito rápida, muito barulhenta, muito psicótica, e me faz bater tanto a cabeça que quase perco as orelhas.


Vendagens lá em cima, turnês invariavelmente sold out, uma banda tecnicamente no auge, e uma seqüência ininterrupta de um álbum a cada dois anos. Próxima parada: Official Live: 101 Proof, o esperado ao vivo do Pantera, que já chama a atenção pela capa. Trata-se de uma (justa) homenagem ao bom e velho Jack Daniels, disparado o melhor whisky que já chapei (que o Chivas não nos ouça).

O álbum traz as apresentações norte-americanas da Tourkill, compreendendo o período de 96 a 97. O quê dizer dessa apresentação?


Eu já assisti a vários shows da banda ao vivo "mesmo", no canal Much Music, e posso garantir: eles são muito, muito bons. Se, sem a carga de estar gravando um "Ao Vivo", os caras arregaçam daquele jeito, pode crer que em Official Live existe uma quantidade ínfima de overdubs, pois eles realmente tocam muito. Mas que existem overdubs, com certeza existem (levantando o volume da platéia em momentos específicos, calibrando a distorção da guitarra na hora dos solos, limando umas entradinhas erradas aqui e ali... um dia farei um post sobre discos "ao vivo" e contarei como o Rob Halford incluiu em seu disco ao vivo uma música que ele nunca tocou em shows, ou como o Helloween gravou um show com o seu baterista antigo e lançou o disco ao vivo com o baterista do Scorpions no lugar dele... puta parênteses, né não?! Acho que vou terminar o texto nele... nah, tô zuando).

Então, os tempos românticos dos "Ao Vivo" já se foram. Momentos como o Viva!, disco clássico do Camisa de Vênus, ou It’s Alive, o clássico do Ramones fase Richie Ramone, ou então o If You Want Blood You Got It, do AC/DC fase Bon Scott, ou o No Sleep Til' Hammersmith, do Motörhead, ou o Kiss Alive I, do, ahn, Kiss, se perderam no tempo e, embora sejam melhores que 99% do que se faz hoje em matéria de rock, não conseguiram fazer a molecada entender que o bom dos discos ao vivo é a energia pulsante, orgânica e a eletricidade natural, com os erros e tudo. Os erros é que eram bons, porra!

Eu vi ninguém menos que o RUSH errando ao vivo, no Maracanã (na 3ª marcação de Overture - The Temples of Syrinx, devidamente retirada do DVD Rush in Rio, uma pena - mas eles eu perdôo), e sabem de uma coisa? Foi autêntico, humano e maravilhoso...!


Mas voltando ao assunto (viajei), podem ter certeza que Official Live, apesar de sua produção irretocável, é bem mais fiel do que se possa imaginar, pois os caras realmente mandam bem.

Estão lá todos os pontos altos desses discos que citei e apenas uma (grande) falha, que é a não-inclusão do clássico Mouth For War. De resto, tudo safo e você ainda leva duas faixas inéditas de lambuja: Where You Come From, um blue-grass metálico com slide guitar Aerosmithiana e I Can’t Hide, uma colisão à mil por hora entre Iron Maiden e Judas Priest. Pra ouvir entornando um Jack Daniels, sem gelo.


Depois disso, eles estrearam no novo milênio com Reinventing the Steel (2000), assunto pra outra vez. A banda acabou logo em seguida, e seus estilhaços deram origem ao conceituado Damageplan, enquanto o vocalista Phil Anselmo se embrenhou ainda mais em seus projetos paralelos (Down, Superjoint Ritual). Mas a incendiária fase noventista ficou na memória.



Post escrito ao som de Rush (Permanent Waves), Metallica (Ride the Lightning) e Pantera (todos esses). Sim, deu tempo e ainda detonei dezenas de copos de café.

Um comentário:

Alexandre disse...

Muito bom artigo.
Já conhecia bem Pantera na época. Mas lembro que no lançamento de Far Beyond Driven e Great Southern Trendkill, as primeiras vezes que ou vi esses discos foi difícil de entender. Acho que é aquilo que vc falou mesmo. Foi a inauguração das Aberturas-Avalanche.