domingo, 19 de janeiro de 2020

Zombie de Ouro 2019


Zombies de Ouro sempre me dão perspectivas. Nesse Zombie de Ouro 2019 não foi diferente. Aquele plano que mencionei na edição anterior? Precisa de ajustes. E ainda bem que o foco aqui é música, quadrinhos e cultura pop em geral, senão já teria largado tudo e me pirulitado para o deserto. Terminar meus dias fumando nargilé e mandando "Africa" no bongô com os tuaregues - ou, na pior das hipóteses, com as caixinhas de som que instalaram lá.

No início do ano, pensei em agitar o blog com uma retrospectiva em suaves prestações - o nosso Retrospec de todo final de mês. Pra ajudar, me inscrevi num punhado de grupos brasileiros sobre HQs (Facebook, principalmente), inclusive alguns de canais do YouTube bem conhecidos. E dá-lhe infos, furos exclusivos, papos bacanas sobre gibis... só que não. O que vi foi um desfile de racismo, homofobia, misoginia e fanatismo político de embrulhar o estômago. Não aguentei uma semana.

De 30 grupos, mantive apenas 3. E após lapidar com uns blocks ainda. Block is beautiful.

Após os percalços iniciais, fui me acertando. No final, até curti o resultado. Foi realmente divertido fazer o Retrospec 2019 - que pode ser recapitulado ao toque de doze cliques:


Ah, esperei 1 ano por esse momento. Que payoff, hm?

Então, naquele mesmo cenário de terra arrasada - e queimada - com a arte sendo o bálsamo para os sentidos...




...assembled?


Discos que mais ouvi


Em geral, álbuns póstumos são caça-níqueis armados por ex-empresários, gravadoras ou herdeiros sem grandes preocupações com coesão discográfica ou integridade artística. You're the Man, de Marvin Gaye, é uma justa, porém ambígua, exceção. O próprio Príncipe do Soul embargou a obra depois de finalizada, em 1972. Motivos: a baixa receptividade do single homônimo e, por incrível que pareça, suas divergências políticas com Berry Gordy, produtor e fundador da Motown - a mesma história que se repete até hoje e que deixa como maiores vítimas as relações humanas, a educação e a arte. E que arte. Em plena fase What's Going On, Gaye podia tudo. Era um merchant de preciosidades soul, funk e r&b com arranjos matadores e uma pegada pop irresistível. Finalmente liberado após quase 50 anos, dá um baile em qualquer artista pop das paradas das 100+. E, para ele, era só mais um dia no escritório...





O selo brit indie Cherry Red Records tem feito um trabalho de resgate histórico de cair o queixo. Um dos melhores é este All the Young Droogs: 60 Juvenile Delinquent Wrecks, uma compilação de pérolas ultraobscuras do glam e do garage rock setentista. Tem um pouco de tudo: dos míticos The Stooges e Mott the Hoople a Taste (banda do Rory Gallagher pré-Rory Gallagher) e a Bowie band The Spiders from Mars até o australiano Supernaut e o escocês Bilbo Baggins (!). Ao todo, o box traz 60 balaços de pura e desaforada deliquência glam/garageira. Um must.





Ouvir o debut solo da cantora e compositora Rosalie Cunningham (ex-Purson) é embarcar numa viagem pelos 60's em toda a sua efervescência folk, psicodélica e occult rocker. Os resquícios stoner da antiga banda e os valores de produção reforçam a atmosfera vintage, com violinos e teclados deliciosos fazendo a cobertura para a estonteante voz de Rosalie. Um doce paradoxo temporal/musical.





Admito que nunca fui muito chegado ao Darkthrone. Old Star é a melhor coisa que já ouvi da instituição black metal norueguesa, há tempos resumida ao duo Gylve Fenris "Fenriz" Nagell e Ted "Nocturno Oculto" Skyellum. A dupla incorporou elementos de heavy tradicional, doom até uns riffs hard rock em meio à podreira from hell. Chega a lembrar uma foda profana entre Candlemass, Celtic Frost e AC/DC (!). Fãs xiitas da fase A Blaze in the Northern Sky (1992) provavelmente ainda estão torcendo seus narizes blasfemos. Que vão para o inferno! - o que, pra eles, deve ser como um desejo de boas férias.


(qualquer semelhança com o riff de "Let Me Put My Love Into You" é mera malandragem mesmo)




Direto de Ulaanbaatar, capital da Mongólia, vem o surpreendente quarteto The HU (termo do idioma mongol ancestral para "humano"). Em seu álbum de estreia, The Gereg, o grupo concebe uma transcendência do folk metal ocidental, mas sem guitarras ou violões no estúdio: é tudo na base do morin khuur, berimbau de boca, tsuur e outros instrumentos tradicionais de tribos mongóis. Enquanto os vocalzões basso profondo quase flertam com o gutural death metal, as harmonias remetem a um bluesão com grunhidos repletos de feeling estradeiro. Ouvir isso por uma Route 66 da vida deve ser uma maravilha.





We Get By é 14º álbum de estúdio da icônica soul woman Mavis Staples. Até que não foram tantos, se pensar que o 1º saiu num longínquo 1969. O disco foi inteiramente produzido e composto por Ben Harper e é provavelmente a melhor coisa que ele já fez na vida. Não é apenas um registro, é um momento. E dos memoráveis. Mavis ainda canta uma barbaridade e passeia pelo blues, pelo soul e pelo gospel como se fosse brincadeira de criança. As canções são diretas, orgânicas e com mensagens poderosas, mesmo delicadas. Fácil, um dos melhores lançamentos do ano.

...e caso alguém esteja se perguntando, a (revoltante) foto da capa é mesmo de uma situação verídica.





Alice Cooper é o cara. Uma baita discografia com uma renca de clássicos, incríveis parcerias multimídia, turnês desbravadoras (o 1º rockstar a se arriscar no matagal de atraso que era o Brasil de 1974), uma carreira produtiva e ininterrupta desde 1964. E ainda teima em lançar registros bacanudos como esse Breadcrumbs. O EP traz seis faixas back to the basics em tributo a Detroit, sua adorada terrinha natal. São três sons novos invocando os dias de garagem e mais três covers de heróis da Cidade dos Motores: Suzi Quatro, Mitch Ryder & the Detroit Wheels num medley com The Dirtbombs e o incendiário MC5. Bolachinha matadora.





Fosse menos carne de pescoço, o carioca Gustavo de Almeida Ribeiro, o Black Alien, seria hoje um dos artistas mais endinheirados do Brasil. Com talento raro, o Alien alia conteúdo com uma notável versatilidade, capaz de dialogar tanto com o rap, quanto rock, reggae e por aí vai. Um pouco disso se deve ao passado no Planet Hemp, onde já se destacava dos companheiros BNegão e Marcelo D2 com uma absurda quantidade de referências por verso quadrado. Abaixo de Zero: Hello Hell é um disco melhor que os anteriores (os herméticos Babylon by Gus vols. 1 e 2) e finalmente coloca em dia o senso pop com suas zilhares de trucagens verbais e rimas obessivo-compulsivas. Catarse com groove.





O combinado punk angeleno The Flesh Eaters iniciou as atividades em 1977. Entre términos e voltas, a classe de '99 vem se mantendo firme e forte. E a despeito dos parcos lançamentos de lá pra cá (míseros 3 discos), nunca parou de excursionar, o que explica a foderosidade de I Used to Be Pretty (título sensacional). O som atual é uma mescla saborosa de blues, punk e jazz rockabillístico - pra ficar mais fácil: pensa numa jam de Cramps e Tom Waits tentando tocar o Exile on Main St. De quebra, ainda tem versões para "The Green Manalishi" (Fleetwood Mac), "Cinderella" (The Sonics) e "She's Like Heroin to Me" (The Gun Club). Não tinha como dar errado.





Laylet el Booree, do Ifriqiyya Electrique, é o álbum que mais me impressionou no ano passado. E um dos que mais me impressionaram em todos os anos anteriores até 1977. O grupo é do sul da Tunísia e de lá emite uma sonoridade abrasiva mixando a música banga tradicional (usada em rituais de adorcismo, em que se convida demônios ao invés de exorcizá-los, puta papo estranho), tambores afrobeat, desert rock, tecno, pós-punk e industrial. A colisão de todos esses gêneros é a tempestade perfeita: um assalto rítmico extremamente pesado, denso, místico e (sobre)carregado de informações. Intenso e transcendente. Discaço.



Ps: menção especial para a faixa "Moola Nefta" (um samba trance industrial apocalíptico?). Poucas vezes ouvi algo tão grandioso e "aldeia global" quanto ela. Merecia um lugar naquela Voyager junto com os outros apetrechos que representam a raça humana.




Reclusa e sem gravar um álbum inteiro há mais de 10 anos, Beth Gibbons finalmente ressurge... com a Orquestra Sinfônica da Rádio Nacional Polonesa regida pelo maestro Krzysztof Penderecki. O disco faz uma homenagem ao consagrado compositor polonês Henryk Gorecki com a execução de sua "Symphony No. 3" - também conhecida como "Symphony of Sorrowful Songs" (órfãos do Portishead, contentai-vos). Mesmo não passando nem perto da soprano clássica idealizada, Gibbons faz parecer que a peça nasceu pra ela e vice-versa. E a canta em polonês, o que rendeu elogios de Penderecki. É belíssima. E onírica, atmosférica, reflexiva. E sim, melancólica. Yes!





No filão de resgates nos porões obscuros do rock, o selo californiano RidingEasy Records tem marcado uns golaços. Curado por Daniel Hall (da RidingEasy) e Lance Barresi (Permanent Records), Brown Acid: The Eighth Trip é um fabuloso compilado de gemas protometal do final da década de 1960 até o início da década de 1970. Uma verdadeira festa stoner, stoned. A série está na oitava edição (óbvio) e recomendo vivamente correr atrás de todas...





Um dos criadores do crossover thrash/groove metal, o Exhorder ficou conhecido como o primo pobre do Pantera. Irmão pobre, na verdade, dada a incrível similaridade entre a música das duas bandas. Da mesma forma que Cowboys from Hell (1990) do quarteto texano, o disco Slaughter in the Vatican (1990) é um clássico da agressão musical. E até hoje se discute quem era o ovo e quem era a galinha - apesar do próprio Phil Anselmo já ter admitido a influência do grupo da Louisiana. 29 anos e várias formações depois, Mourn the Southern Skies coloca o Exhorder novamente na ordem do dia com um thrash brutal, moderno e groovy na medida. Pedrada!





Em 2010, a Internet pirou quando vazaram vídeos de Prince ensaiando num porão em 1984. Era O Artista, tão famoso por seu perfeccionismo obsessivo, num raro momento de - vá lá - intimidade, sem holofotes ou big produções. Só genialidade pura, nua e crua. A alegria durou pouco: em menos de uma semana, os advogados da Alteza de Minneapolis varreram tudo do mapa. Então, ele certamente acharia um tremendo mau gosto o lançamento deste Originals. O disco - um caça-níqueis descarado - compila as versões demo de canções que Prince escreveu e deu para outros artistas. Não faltam os hits "Nothing Compares 2 U", "Love... Thy Will Be Done" e "Manic Monday", mas o ouro mesmo são as preciosidades pop/funk dadas de bandeja para The Time, Sheila E., Apollonia 6 e outros sortudos. Desculpa aí, Prince, mas isso aqui é bom demais.





O título de "Hendrix do Deserto" anda disputado. Mdou Moctar é do Níger e foi um dos precursores na fusão da música tradicional tuareg com guitarra distorcida, synths e outros equipamentos modernos. Até chegar lá, foi dureza, mas chegou, assim que chegaram nele. O excelente Ilana (The Creator) já é o quinto álbum do rapaz (34 anos) e seu discreto arraso na guitarra o coloca no nível de outro notório guitar tuareg hero. Senão acima...





Só fui conhecer o Big Business agora (a banda, não o way of life), mas The Beast You Are já é o seu sexto disco, fora a carreirada de EPs e singles. O duo de Seattle é formado pelos figuras Jared Warren (baixo, vocais e sintetizador) e Cody Willis (bateria e backings), ou seja, uma ex-cozinha do Melvins. Além disso, também excursionaram com o Torche. Acaba que o som tem um pé e meio no stoner-sludge esporrento daquela seara. O diferencial é a influência bem inserida do Led Zeppelin orientalzão, fase Bombaim. Grande negócio.





O selo Grapefruit Records é outro que tem feito um trabalho arqueológico sensacional. Um de seus lançamentos recentes é este fabuloso I'm a Freak 2 Baby: A Further Journey Through the British Heavy Psych and Hard Rock Underground Scene 1968-73, 2ª parte de um projeto que chafurda os primórdios da cena pesada britânica (duh!). O álbum triplo resgata obscuridades maravilhosas, como Orang-Utan, The Rats (com o Mick Ronson), Sam Gopal (com o jovem Lemmy na guitarra e vocais!), The Move (a banda pré-ELO) e Stray (que já foi coverizado pelo Iron Maiden), mas também traz uma ou outra figurinha mais conhecida (Budgie, Jeff Beck, Atomic Rooster, The Crazy World of Arthur Brown). E ouvir uma cover de "Paranoid" que soa ainda mais velhusca que a original não tem preço.





Low profile, só agora Michael Kiwanuka chega ao 3º disco, intitulado simplesmente KIWANUKA (e precisa mais?). Além do soul/r&b rebuscado dos discos anteriores, a pegada agora traz um sabor indie rock com boas doses de psicodelia. A produção (de Danger Mouse) é certeira nesse encontro de grooves viscerais com águas calmas e curativas. Mais uma vez, um disco irretocável.





Finalmente o Tool saiu da sala de parto do estúdio com seu aguardadíssimo novo álbum, Fear Inoculum. Foram longos 13 anos desde o bem-sucedido 10,000 Days (que os induziu ao ZdO 2006, veja só) - um delay que rendeu até imbecis ameaças de morte ao cantor Maynard James Keenan por sua suposta culpa no atraso da produção. O único real problema de Fear Inoculum é soar mais "normal" e menos impactante que 10,000 Days. Resultado, talvez, do timing há muito perdido pela banda. De qualquer forma, seu post-metal progressivo se mantém afiado e imersivo como sempre. O disco é muito bom, mas, parafraseando o próprio Keenan, teria sido fantástico há oito anos.





Lá pelos idos de 87/89/92, The Young Gods era o melhor e mais bem guardado segredo do universo musical. Não era só comigo: a crítica pirava com os suíços avant-garde. Daí que após 34 anos de discos, shows e paradigmas quebrados, aquele tal "risco", há tempos, inexiste. Data Mirage Tangram soa como um encontro entre as facetas post-industrial e ambient do grupo (antes era cada qual no seu canto). E com uma falta de urgência desconcertante. Os Jovens Deuses viraram Deuses Tiozões, mas me ajudaram a sair do ar várias vezes no ano que passou. A bença, Franz Treichler & Cesare Pizzi.





Nos últimos anos tenho consumido desert blues como louco. Belezinhas exóticas e áridas como Mdou Moctar, Bombino, Imarhan, Bassekou Kouyate & Ngoni Ba e outros não saem mais da minha playlist. E em 2019 também fiquei encantado pela bela cantora e percussionista saarauí (do Saara Ocidental) Aziza Brahim. Sua voz doce e evocativa faz do álbum Sahari uma das experiências mais agradáveis e intimistas que ouvi no ano passado. Assim como alude a capa, a beleza também pode surgir dos lugares mais improváveis - e das condições mais difíceis.





Após oito anos, o Rival Sons saiu da Earache e o magnífico Feral Roots é o primeiro álbum pela grandona Elektra. Nem grana no bolso estraga os caras. Rival Sons não faz disco ruim. Próximo!





O Black Pumas foi criado em 2017 pelo excelente cantor Eric Burton e pelo guitarrista e produtor Adrian Quesada. Especialidade: funk e r&b urbano... direto de Austin, Texas. Neste debut homônimo, o duo mostra um know-how de veteranos com grooves e climas que remetem a uma jukebox soul das décadas de 1960 e 1970. Contagiante do início ao fim.





Weyes Blood é a cantora, compositora e multi-instrumentista californiana Natalie Laura Mering. Titanic Rising é seu 4º álbum (o primeiro pela Sub Pop, que todos conhecemos de outros carnavais) e foi bastante incensado pela crítica. Merecido. O álbum é uma pintura de chamber pop - ou até baroque pop, pra ficar num terreno mais údigrúdi. Com voz terna e enigmática, imensa sensibilidade melódica e arranjos ultraperfeccionistas, a música de Natalie tem ecos de Joni Mitchell e, especialmente, dos Carpenters, mas com uma pulsação toda particular. E essa capa é um negócio insano...





O King Gizzard & The Lizard Wizard conseguiu uma façanha: fundir stoner rock com thrash metal. Geralmente, quando alguém tenta, acaba resvalando pro doom ou pro sludge. Mas em Infest the Rats' Nest, o sexteto australiano executa a arriscada fusão com sucesso. Fica até engraçado às vezes, relando na fuleiragem. E ainda tem doses maciças de space rock, progressivo e psicodelia. Mas as pancadas thrash é que pagam a fatura.





Realmente, não há outro como There Is No Other. O collab da fantástica musicista americana Rhiannon Giddens com o jazzista e multi-instrumentista italiano Francesco Turrisi resultou numa obra maestra, grandiosa e, ainda assim, sublime e intimista. É uma jornada de rara beleza pelo coração interiorano da América, do Mediterrâneo e da África Ocidental. A sonoridade evoca uma volta às raízes e até mesmo uma declaração nativista. Mais: prova, pela enésima vez, que feeling e virtuosismo não só podem andar juntos, como se completam. Um registro memorável. E ainda tem a contribuição do nosso Hermeto Pascoal no arrasta-pé "Brigg's Forró".





Surreal como o Torche só melhora. Mesmo com alterações na escalação - sai o guitarrista Andrew Elstner, entra o baixista Eric Hernandez e Jonathan Nuñez troca o baixo pela guitarra - o grupo consegue produzir este colosso de álbum que é Admission. Seu crossover magmático de post-rock, metal, stoner e sludge é de estourar os tímpanos, mas sem perder a ternura. Jamais. Sério candidato ao Top 5 do ano passado.





Jobcentre Rejects: Ultra Rare NWOBHM 1978-1982 é um catadão fora de série lançado pela On the Dole Records. A bolacha é realmente composta de obscuridades die hard da New Wave of British Heavy Metal: nada de futuros craques como Diamond Head ou Iron Maiden (ou o Blitzkrieg e o Def Leppard das camisetas da capa) e, por isso mesmo, é divertido demais. Alguns sons nem mesmo são heavy metal, e sim uns hard/boogie à Status Quo/Cactus/Foghat. Esse é pra ouvir com o volume no talo e detonar aquelas Heineken que estão trincando na geladeira...



Menções honrosas/quase lá:

Moral Instruction, de Falz - rapper nigeriano com um blend bem sacado de afrobeat e hip hop.
The Furnaces of Palingenesia, do Deathspell Omega - black metal francês complexo, dissonante, caótico e foda.
Destroyer, do Black Mountain - space rock e stoner com uma pitada extra de space.
Zuu, de Denzel Curry - o melhor rappeiro americano da atualidade.
The Heretics, do Rotting Christ - 13º disco do Cristo Apodrecendo. Espero que não me taquem coquetéis molotov.
Quocumque jeceris stabit, do Uzeda - math/noise rock siciliano encontrado e produzido por Steve Albini.
Revelations of Oblivion, Possessed - retorno em grande forma dos avôs do death metal.
Free, de Iggy Pop - o Iguana anda soando meio deprê, mas segue como vinho.
Something Wicked Marches In, do Vltimas - supergrupo death (David Vincent + uns Mayhem e Cryptopsy) elegantemente martelando 666 na zoreia.
Somebody's Knocking, de Mark Lanegan - acredite se quiser, Lanegan agora soa como o New Order das antigas.



Faixa bônus: melhor show do Rock in Rio 2019

Teria sido um festivalzão, fosse uma única data com os highlights...

Como sempre, Sepultura, Nervosa, Anthrax e Slayer fizeram shows raçudos, violentos e divertidíssimos.

Nile Rodgers & Chic é coisa fina: foi um privilégio testemunhar os hits, a musicalidade e a experiência do homem, dos excepcionais músicos e das maravilhosas cantoras que o acompanham. Showzaço, mesmo enfrentando falhas no som.

King Crimson... ainda estou me beliscando para acreditar que Robert Fripp, Tony Levin, Bill Rieflin & Cia. estiveram por lá. Tão bom quanto surreal.

Mas é festival e leva quem melhor interage e rege a massa de centenas de milhares de pessoas. E nisso, Iron Maiden e Pink foram brilhantes.


O Maiden, com uma mis-en-scène mais carregada que o habitual, enfileirando clássicos atrás de clássicos (finalmente "Revelations"!) e, o principal, o grande Bruce Dickinson ressurgindo heroicamente e se adaptando com coração e inteligência à sua nova realidade vocal.

Já a carismática Alecia Beth "P!nk" Moore Hart deu uma aula de entretenimento pop: dança e canta muito (e sem playback), tem total domínio de cena, ótimos músicos, arrisca o pescoço em acrobacias suicidas (ela "voa" pela Cidade do Rock!), traz mensagens relevantes e corajosas, enfim, promove um espetáculo ipsis litteris - e olha nem sou familiarizado com o repertório da artista.

Dois gigantes em suas áreas.

Empate técnico. Vence a Dama Rosa.



Sessão de cinema do ano


A esta altura, o que ainda poderia ser escrito sobre Vingadores: Ultimato? Apenas me reservo a comparar a apoteótica sessão à estreia inesquecível de O Exterminador do Futuro 2: um cinema lotado e insandecido que parecia uma final de campeonato num estádio de futebol. Torcemos, sofremos, empurramos o time e, no fim, saímos todos campeões.



Melhor repaginada de She-Ra, a Princesa do Poder


She-Ra e as Princesas do Poder. Oboy... vamos lá: o novo desenho é muito legal. Admito, fiz coro na zoação massiva em cima do novo visual da clássica heroína e, enquanto isso, deixava passar o mais importante: a showrunner é talentosa quadrinhista Noelle Stevenson. Dona de um texto sagaz e espirituoso, Noelle mastiga e cospe os clichês de espada & magia e de super-heróis - vide suas obras mais conhecidas, Lumberjanes e, especialmente, Nimona, um dos melhores gibis de 2016. O fato de ter três Eisners, um Harvey e um GLAAD no currículo não é mera coincidência. Tudo isso se reflete na série animada da DreamWorks/Netflix, que está atualmente na 4ª temporada e, lógico, tem muita influência do universo das HQs - de Akira a Novos Deuses a O Homem que Tinha Tudo, só pra catar alguns. Tal qual o original, o desenho é orientado para o público feminino infanto-juvenil (isso nunca nos impediu antes) com o diferencial de ser 100% inclusivo - e não apenas integrado à faixa LGBTQ+, como muito além. Uma belíssima supresa.



Filme do ano


Essa cena é maravilhosa...

Co-escrito e dirigido por Bong Joon-ho, Parasite é uma improvável combinação de thriller, filmes de golpe, humor negro, drama e gore incrivelmente bem desenvolvido e com uma metáfora pesada à desigualdade social. Aliás, é notável o fato de ser uma produção sul-coreana ao invés de brasileira, indiana... enfim, de alguém dos BRICS. Por mim, levava todas as indicações que recebeu do Oscar.


Menção honrosa:

Morto Não Fala, de Dennison Ramalho. Sem muito alarde, o cineasta roteirizou e dirigiu um filmaço. A produção é esperta e eficiente e as atuações marcantes de Daniel de Oliveira, Fabiula Nascimento, Bianca Comparato e Marco Ricca - fora os molequinhos, bem talentosos - fazem do longa uma das melhores surpresas do gênero em um bom tempo. Terror brasileiro com cara de realidade brasileira. Ou seja...



HBO do ano


Chernobyl, de Craig Mazin. Mais que uma minissérie histórica, é o acerto de contas com a História que a minha geração aguarda há três décadas. Minuciosamente produzido, escrito, dirigido e com um cast que é até brincadeira. Jared Harris, Stellan Skarsgård e Emily Watson são gênios e todo o elenco - dos coadjuvantes aos figurantes - está completamente engajado. Não só uma das melhores séries da HBO, como uma melhores (e mais importantes) já feitas em todos os tempos.


Menção honrosa:

Watchmen, de Damon Lindelof. Uma sequência perfeita e absurdamente fiel ao conceito do clássico original. Arrisco chutar que até Alan Moore aprovaria, caso ligasse pra essas coisas.



Leitura tensa do ano


Tensa, densa e intensa. Publicado em 2002, No Bunker de Hitler: Os Últimos Dias do Terceiro Reich, de Joachim Fest (1926-2006), é uma investigação sobre os últimos anos, meses, semanas, dias e horas de Adolf Hitler e seus pares. É uma experiência profundamente claustrofóbica e perturbadora. O livro foi uma das bases usadas para o filmaço Der Untergang (Oliver Hirschbiegel, 2004), que, agora posso afirmar tranquilamente, ficou parecendo um passeio no parque. O fanatismo dos seguidores do Führer - mesmo em meio à circunstâncias mais trágicas e insustentáveis - cruzava a fronteira da demência. Hitler, temo afirmar, se tornou uma ideia. Que perdura até hoje, pelo visto. Já li duas vezes.



Quadrinho deslumbrante do ano



O Vento que Sopra os Pinheiros (ex-A Balada de Sylvan), da artista chinesa Zao Dao. É de tirar o fôlego. E olha que a concorrência em 2019 estava quentíssima, com obras como Tanka, Os Mitos de Cthulhu, Os Novos Titãs: A Origem de Lilith, Alvar Mayor, Batwoman e Lone Sloane sendo publicadas em ritmo industrial. A editora Figura, até aqui, segue como a Nadia Comăneci das editoras nacionais. Bravo!



Quadrinho de super-heróis do ano


House of X e Powers of X - ou, carinhosamente, HOXPOX - de Jonathan Hickman. Há tempos não ficava sem chão com gibis de super-heróis desse jeito. Na ocasião, cheguei a esquadrinhar minhas eufóricas impressões por aqui. O escopo é gigantesco. E se a Marvel for esperta, vai usar como guia para a reapresentação dos X-Men nos cinemas. Não importa o que tenha vindo depois - inclusive pelas mãos do próprio Hickman...


And... cut!


Declaro aberta a temporada de dicas, concordâncias e discordâncias nos comentários. Diferenças são bem-vindas. Polarizações, irão para o Gulag!

4 comentários:

rock4you disse...

Uma das coisas que eu admiro das suas listas é a diversidade com qualidade.

Agora metendo o bedelho aonde não sou chamado
Acrescentaria na sua lista os seguintes ingredientes

-Dead Fish - Ponto cego
-Rammstein
-Rotting Christ – The Heretics
-Jonnata Doll e os Garotos Solventes - Alienígena

-Series
The Boys
Chernobyl

Anime
Vinland Saga

Filmes
O irlandês
Vidro
Jojo Habbit
Shadow ( ninjas/samurais muito bom)
Nos
Doutor Sono
Hail Satan ?( Documentário )
One Cut Of Dead (Kamera O Tomeru Na!)
John Wick 3
Zumbilandia 2
Alita Anjo de Combate

Menção Honrosa:
Bacurau
Midsomar (apesar de preferir mil vezes hereditário )
Era uma vez em Hollywood


doggma disse...

E aí, rock4you!

Aqui no BZ todos os bedelhos têm "all access"! rs

Preciso conferir o novo Dead Fish e esse Jonnata Doll (não conhecia). Rotting Christ ficou na "Menções honrosas", mas é uma porradaria absurda mesmo.

Curti o novo Rammstein, mas achei meio preso na fórmula. Gostei mais do disco do Lindemann.

The Boys é sensacional (HQ e telessérie), mas Chernobyl foi minha campeã do ano.

Valeu pelas dicas de filmes (muita coisa interessante aí, hein) e o anime de Vinland. Só tinha ouvido falar do mangá.

Abraços!

Marcelo Andrade disse...

Salve Doggma!
Valeu pelas dicas musicas e sim HOXPOX ainda estou digerindo o que li; jamais achei que me surpreenderia c/ a "rouṕagem" das ideias e da cena de Apocalipse e Xavier dando as mãos e o desenvolvimento do personagem junto aos membros classicos da escola. Bom ano p/ todos nos! Abraço

doggma disse...

Salve, Marcelo!

HOXPOX pra mim foi um "game-changer" dos mutunas. O melhor é que funciona isoladamente também - independente do direcionamento que a Marvel adotar dali pra frente. Fica a "História Final do Universo Mutante" idealizada, de qualquer forma. Eu encararia na boa. E pegarei o futuro encadernado como se fosse!

Um bom ano para todos nós é tudo que peço!

Abração!